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MENSAGENS FINAIS |
O Nome de Deus
by HP Odracir
"Nosso Pai nos céus, santificado seja o teu nome." Mateus 6: 9 (TNM)
Nota 1: As fontes bibliográficas deste artigo acham-se em - http://www.tetragrammaton.org
Nota 2: Recomendamos a leitura complementar em - http://www.geocities.com/torredevigia/tnm.htm
Índice
"Portanto, o mais destacado aspecto desta tradução é o restabelecimento do nome divino no seu lugar legítimo... Fez-se isso pelo uso da forma há muito aceita 'Jeová', 6973 vezes nas Escrituras Hebraicas e 237 vezes nas Escrituras Gregas Cristãs." Assim diz a introdução da Tradução do Novo Mundo das Escrituras Sagradas com referências (TNM, daqui para a frente), obra publicada pelas Testemunhas de Jeová em 1986, na verdade, sua versão revisada da Bíblia Sagrada. Sem a restrição da modéstia, essas palavras parecem expressar uma forte convicção dos editores no sentido de que sua tradução é superior a todas as demais. Tal dedução é corroborada, ainda, pelo que diz a publicação Toda a Escritura é Inspirada...,1966, p. 314, também publicada pelas Testemunhas. Vejamos: "As Testemunhas de Jeová reconhecem-se endividadas para com todas as muitas versões da Bíblia que usaram em chegar à verdade da Palavra de Deus. Entretanto, todas essas traduções têm os seus defeitos. Há incoerências ou traduções insatisfatórias, infestadas de tradições sectárias ou filosofias mundanas, e, por conseguinte, não estão em plena harmonia com as sagradas verdades que Jeová registrou em sua palavra." (Grifo acrescentado) São razoáveis estas afirmações? Mais que isso, poderia a TNM, mediante um estudo elucidativo, ser isoladamente aprovada em um teste quanto a estar completamente livre - como dizem seus editores - de 'defeitos', 'tradições sectárias' e 'filosofias mundanas'? Cumpriu ela algum requisito firmemente apoiado na arqueologia e erudição textual que as muitas outras traduções ou versões da Bíblia falharam em observar? Tais questões merecem um exame sério e imparcial. Voltemos nossa atenção para o aspecto aparentemente distintivo da TNM - a alegada "restauração" do nome de Deus. Neste respeito, os editores dizem: "... seria uma grande indignidade, sim, uma afronta à majestade e autoridade [de Deus], omitir ou ocultar seu ímpar nome divino, que ocorre de modo bem claro no texto hebraico..." - TNM, 1986, p. 6 Certamente, qualquer cristão concordaria que é uma grande responsabilidade aquela de transmitir para as diversas línguas as palavras dos escritores bíblicos inspirados, ainda mais se tratando do nome do Todo-Poderoso. Tomar liberdades indevidas com o texto - além de eticamente inaceitável - poderia distorcer seu sentido e dar margem a toda forma de sectarismo religioso. A propósito, a Sociedade Torre de Vigia - a editora da TNM - afirma, com respeito a sua obra: "Evitou-se tomar liberdades com os textos... ou substituí-los por algum paralelo moderno quando a tradução literal tem sentido claro. Manteve-se a uniformidade de tradução por por atribuir um só sentido a cada palavra principal e por reter este sentido tanto quanto o contexto o permitiu." - TNM, p. 7 (Grifo acrescentado) Todavia, a organização acrescenta: "Tem havido desvios ocasionais do texto literal, com o fim de transmitir as expressões idiomáticas hebraicas e gregas..." (Grifo acrescentado) Toda a Escritura é inspirada e Proveitosa..., 1966, p. 318 Contraditórias como pareçam, as duas afirmações acima revelam uma inevitável dificuldade com a qual qualquer tradutor bíblico, mais cedo ou mais tarde, se depara, a saber, a forma mais adequada pela qual verter - em termos que levem em conta o idioma e a cultura do público-alvo - as idéias de autores cuja língua, alfabeto e cultura acham-se a milênios de distância. Evidentemente, certa medida de 'liberdade' com o texto - ainda que seja um recurso gramatical aceitável sob certas circunstâncias -, apresenta, amiúde, uma armadilha sutil: o tradutor poderá selecionar a palavra ou expressão que ele próprio julga mais conveniente, aquela que melhor se ajusta à suas preferências pessoais ou teológicas. Neste caso, os assim chamados 'desvios ocasionais' dão margem a criação de paráfrases, ou seja, a substituição de parte do texto por uma interpretação particular de seu sentido. É um risco ao qual nenhuma equipe tradutora do mundo está imune - isto certamente inclui os autores da TNM. O objetivo deste artigo é familiarizar o leitor com os certos aspectos históricos, bem como princípios elementares de arqueologia, gramática de línguas arcaicas e teologia, que o habilitem a compreender o tema em questão, ao ponto de avaliar se os autores da versão bíblica amplamente usada pelas Testemunhas de Jeová foram, de fato, coerentes ao inserir 237 vezes, no Novo Testamento, uma forma peculiar de tradução para o nome divino. Ao mesmo tempo, será possível verificar se eles próprios alguma vez tornaram-se ou não culpados das práticas nada ortodoxas que atribuem a outros tradutores - 'tradições' ou 'filosofias sectárias'.
"Suponhamos que eu vá ter com os filhos de Israel e deveras lhes diga: 'O Deus de vossos antepassados enviou-me a vós', e eles deveras me digam: 'Qual é o seu nome? O que hei de dizer-lhes?" - Êxodo 3:13 Com estas palavras, Moisés criou o ensejo para a revelação de um nome ímpar, do qual seus antepassados não tinham conhecimento pleno. A resposta divina a essa pergunta foi: "EU SOU AQUELE QUE SOU... Eis como responderás aos israelitas: 'EU SOU' envia-me junto de vós. Deus disse ainda a Moisés: JAVÉ, o Deus de vossos pais,... envia-me junto de vós." - Êxodo 3: 14, 15 (Centro Bíblico Católico) O nome divino, vertido acima como Javé, consiste, na verdade, de uma palavra de quatro letras hebraicas - - o tetragrama (palavra grega que significa "quatro letras"). Indubitavelmente, o tetragrama constava dos escritos originais do Antigo Testamento. Não há razões para contestar este fato específico. Segundo o relato de Êxodo, Moisés teria sido o primeiro servo de Deus ao qual se apresentou formalmente o nome divino. É intrigante que, passadas várias gerações de servos fiéis de Deus, somente a Moisés Ele tenha se revelado por meio do tetragrama. Abraão fora chamado pelo Todo-Poderoso da terra de Ur dos caldeus, centro irradiador de uma infinidade de deidades, sem que o tetragrama lhe fosse formalmente revelado como forma de distinguir o Deus verdadeiro dos deuses falsos. Se este havia de ser um memorial eterno e obrigatório, único e imprescritível para todos os adoradores de Deus - e não apenas ao povo israelita sob lei mosaica -, por que não fora revelado já aos primeiros servos leais, como Abel, Enoque, Noé ou o próprio Abraão, com quem Deus estabelecera um pacto de longa duração? Por que, durante o período patriarcal, prevaleceu a expressão 'El Shadday' (Gênesis 17: 1)? Estas são indagações pertinentes ao objeto de nosso estudo. Moisés foi incumbido de apresentar o recém-revelado nome como pertencente ao 'Deus de Israel' (Êxodo 3: 18). A partir dessa revelação e da libertação da escravidão no Egito, o nome divino passou a ser, sem dúvida, a palavra mais freqüentemente proferida pelo povo israelita pactuado. Também passou a ser seu estandarte diante das muitas nações que desalojariam em busca de sua terra prometida. Contudo, com o passar dos séculos, ocorreu uma coisa surpreendente: a pronúncia original do nome foi perdida. É deveras notável que uma das palavras mais pronunciadas de todos os tempos tenha, paradoxalmente, tornado-se a mais obscura. Como se deu isso? Uma série de fatores contribuíram para este processo, entre eles: a) O nome era restrito a uma sociedade fechada - o povo israelita, sob a lei mosaica; b) Seu alfabeto não possuía sons vocálicos, ou seja, o leitor dependia de informação de sua própria cultura para saber como suprir os sons vocálicos ao ler os símbolos consonantais que compunham as palavras; c) Temendo tomar o nome de Deus 'em vão' (Êxodo 20: 7), gradativamente, o povo adquiriu o costume de não pronunciar o tetragrama em seu cotidiano, reservando seu uso para ocasiões especiais, como em orações no seu templo, sob a supervisão de um sacerdote. Há evidências de que proferir o nome sagrado converteu-se, com o tempo, em uma prerrogativa exclusiva do sacerdócio Aarônico. Neste respeito, a autora Karen Armstrong - especialista em religiões - comenta: "Os judeus eram mesmo proibidos de pronunciar o seu nome, um poderoso lembrete de que qualquer tentativa de expressá-lo seria considerada inadequada: o nome divino, escrito YHVH, não era pronunciado em nenhuma leitura da escritura." - Uma História de Deus (1994), p. 84 De fato, muito embora outros nomes, como o já mencionado 'El Shadday', pudessem ser aplicados a Deus, aquele fornecido a Moisés no fumegante monte Horebe passou a ser objeto de temor especial entre os israelitas. Obviamente, isto teria conseqüências inexoráveis sobre o uso futuro do tetragrama. A combinação dos fatores acima teve força decisiva no obscurecimento da pronúncia do nome divino, levando-o à condição de um segredo perdido. O conhecimento da pronúncia de uma palavra, em hebraico antigo, depende de seu uso. Sem o uso e transmissão da palavra - de uma geração a outra - e sem símbolos vocálicos, sua pronúncia está irremediavelmente perdida. Uma solução teria sido verter o nome para outro idioma - um que possuísse símbolos vocálicos. Lamentavelmente, porém, isso jamais aconteceu. Os judeus, sendo extremamente tradicionalistas e xenófobos para com as nações à sua volta, certamente teriam escrúpulos quanto a verter sua palavra sagrada para algum idioma gentio. Se eles próprios tinham receio quanto ao uso cotidiano dela em sua comunidade, quão menos dispostos estariam a introduzi-la no vocabulário daqueles a quem consideravam 'pagãos'. O tetragrama tornou-se uma espécie de 'fetiche' para eles - um sinal secreto distintivo, que os punha acima de todos os outros povos. Tal ênfase desmedida a um símbolo acabou por sepultar sua pronúncia sob o manto de um passado remoto. A partir desses fatos, podemos reconstituir o cenário histórico que determinaria como o tetragrama chegaria às gerações futuras.
Como transformou-se em 'Jeová'?
Conforme já explicamos, o alfabeto hebraico não dispunha de símbolos vocálicos. Porém, por volta do 4º. século DC, um grupo de peritos judeus chamados massoretas, acrescentaram - não letras - mas pontos vocálicos aos caracteres hebraicos, de modo a padronizar a pronúncia. Para facilitar o entendimento do leitor, faremos uma analogia com a frase 'ontem fez sol'. Se lermos a sentença sem as vogais, temos: ntm fz sl Repare o leitor que a expressão, grafada dessa maneira, lança incerteza quanto à correta pronúncia das palavras. O termo 'sl', por exemplo, dá margem a múltiplas interpretações - alguém poderia tomá-lo como significando 'sal', 'sol' ou 'sul'. A menos que a pessoa estivesse previamente familiarizada com o contexto ou com a pronúncia original, não teria como reconstituir a sentença com precisão. Por outro lado, se tivéssemos de deduzir aleatoriamente que vogais estariam faltando em sentenças como a acima, nossa tentativa de reconstrução do texto original - com grande probabilidade - resultaria em uma deturpação de seu sentido. A mesma dificuldade haveria com relação à pronúncia do nome divino para as pessoas que não pertencessem à comunidade judaica dos tempos pré-cristãos. Esta condição permaneceu durante séculos - enquanto cópias do Antigo Testamento eram feitas - e estendeu-se até a primitiva era cristã. Ilustrando agora o que os massoretas fizeram nos séculos seguintes, apliquemos, na nossa frase de exemplo, as vogais na forma de 'pontos': ontem fez sol Agora a pronúncia está clara. Todavia, a analogia que propusemos é limitada, visto que informamos de antemão ao leitor qual era a expressão original. Bem diferente era a situação dos massoretas do 4º. século - no caso deles, somos levados a perguntar: tendo eles introduzido seus sinais vocálicos em uma época em que a pronúncia do nome já era obscura, como escolheram os pontos vocálicos? Se eles próprios não conheciam o som original - e, mesmo que o conhecessem, teriam escrúpulos quanto a representá-lo graficamente -, quais vogais introduziriam, afinal? A obra Theological Wordbook of the Old Testament [Dicionário Teológico do Velho Testamento], 1980, Vol. 1, p. 13, elucida o mistério: "Para evitar o risco de tomar o nome de Deus... em vão, judeus devotos começaram a substituir o nome próprio pela palavra ['adonay']. Embora os massoretas deixassem as quatro consoantes originais no texto, acrescentaram as vogais 'e'... e 'a' para lembrar o leitor de pronunciar 'adonay', sem considerar as consoantes." (negrito acrescentado) Vemos, assim, que os massoretas tinham de tomar uma decisão: reproduzir o tetragrama hebraico em forma pura ou simplesmente transcrever, em seu lugar, o vocábulo adonay (kyrios em grego) - consagrado há séculos e bem conhecido do público ao qual o texto se destinava. Na primeira hipótese, teriam um sentimento de fidelidade ao texto hebraico primitivo, porém a inteligibilidade da cópia sofreria; na segunda hipótese, priorizava-se a compreensão da palavra, aceitando-se como preço o desvio do texto original. Os massoretas preferiram adotar, para este impasse, uma solução intermediária, a saber, a criação de uma palavra híbrida - resultado da intercalação das consoantes de um nome, cuja pronúncia havia se perdido séculos antes, com as vogais de um substitutivo amplamente consagrado pela tradição judaica. As consoantes eram oriundas do tetragrama hebraico e os sinais vocálicos, da expressão ED - ON - AY (correspondente a adonay ou 'Senhor') e Elohim ('Deus'), as quais, diferentemente do nome divino, foram traduzidas para o grego. O resultado final foi:
Como o leitor daqueles tempos lia a palavra acima? Segundo a obra há pouco mencionada, ao deparar-se com a expressão criada pelos massoretas, ele pronunciava, em sua língua, 'Senhor', já que a pronúncia literal não faria sentido algum. Em outros palavras, estamos diante de um circunlóquio, ou seja, uma expressão pronunciável que substitui uma outra impronunciável. É importante que guardemos este conceito, pois voltaremos a tratar dele mais adiante. O livro ajuda ao Entendimento da Bíblia - publicado pelas Testemunhas de Jeová -, pp. 884,885 (em inglês), diz: "Por combinar os sinais vocálicos de 'Adonay' e 'Elohim' com as quatro consoantes do tetragrama, as pronúncias 'Yehowah' e 'Yehowih' foram formadas. A primeira destas proveu a base para a forma latinizada 'Jeova(h)'. O primeiro registro de uso dessa forma data do século 13 DC. Raimundus Martini, um monge espanhol da Ordem Dominicana, a usou..." (negrito acrescentado) Perceba o leitor que o primeiro uso do nome hoje adotado pelas Testemunhas de Jeová não começou com a igreja cristã primitiva. Formou-se mais de um milênio após o surgimento dela, por intermédio de um monge católico. Como trata-se de uma palavra híbrida - a aglutinação das consoantes 'Y-H-V-H' (oriundas do tetragrama) com as vogais 'e-o-a' (retiradas do termo 'Senhor' em hebraico) -, concluímos que apenas a porção consonantal da tradução do nome original poderia estar sendo pronunciada hoje pelas Testemunhas de Jeová, pois a porção vocálica pertence a um substitutivo. Querendo ou não, isto significa que, pelo menos em parte, aquele substitutivo - 'Senhor' - ainda é usado por elas. Em outras palavras, o vocábulo 'Jeová', em si mesmo, é um circunlóquio, oriundo da combinação de duas palavras de sentidos e pronúncias diferentes. Equivaleria a combinar as consoantes do nome 'B-a-a-l' (deidade dos antigos caldeus) com as vogais da palavra 'S-e-n-h-o-r'. O resultado seria 'Belo', uma palavra com pronúncia e sentido totalmente distintos das anteriores. Com efeito, a intenção dos massoretas do 4o. século não era a de remeter o leitor à pronúncia original - até porque isso seria impossível àquela altura -, mas tão-somente o de induzi-lo a pronunciar "Senhor" diante do tetragrama, como já era o costume secular. A preservação das consoantes hebraicas visava, basicamente, a manter a fidelidade ao Antigo Testamento. Diante do exposto, não podemos concluir senão que os editores da TNM insistem hoje - em nome da reverência a Deus - no uso do amálgama YHVH/adonay, um código cuja pronúncia literal não fazia qualquer sentido para os judeus do 1o. século, tendo sido introduzida por um monge da Ordem Dominicana, no século 13. Em confirmação a esta conclusão, vejamos como algumas respeitadas obras seculares definem o nome 'Jeová':
Existem, até hoje, controvérsias quanto à correta pronúncia de , havendo algumas alternativas como Javé, Iavé etc., todas elas gramaticalmente possíveis. Todavia, a forma correta - qualquer que seja ela - não pode ser aquela eleita pela Sociedade Torre de Vigia, já que, como vimos, tal termo provém de um erro grosseiro de leitura, o qual tornou-se tradicional. Segundo alguns peritos em línguas mortas, há evidências fortes em favor da forma Iahweh - amplamente utilizada, por exemplo, na Bíblia de Jerusalém (1973). No entanto, a Sociedade Torre de Vigia justifica a adoção da forma 'Jeová' por ser ela "há muito aceita" (TNM, p. 6). De fato, no apêndice 1A da TNM, a comissão tradutora reconhece que sua tradução "continua a usar a forma Jeová, por causa da familiaridade das pessoas com ela já por séculos" (p. 1501). Dito de outra forma, o emprego da palavra, bem como sua introdução na TNM, foram alicerçados na 'tradição' - uma prática já qualificada pela Sociedade como uma das 'contaminações' que 'infestam' outras traduções da Bíblia. Deveras, as tradições têm muita força. Para ilustrar, seria bem pouco provável, após todos estes anos, que o movimento religioso "Testemunhas de Jeová" subitamente alterasse seu nome para "Testemunhas de Iavé", caso estudos mais recentes apontassem com boa margem de confiança para esta forma, ao invés daquela preferida e consagrada entre seus membros desde os anos 30. A tradição continua a ter um relevante papel na cultura cristã atual, assim como tinha para os cristãos do primeiro século. Confrontados com estes fatos, os editores da TNM enfatizam o aspecto da intenção, colocando a questão técnica da pronúncia em um plano secundário ("O Nome Divino que Durará para Sempre", 1984, p.7). Neste caso, vêm à tona algumas indagações: não é o uso do tetragrama pelos cristãos na atualidade, em si mesmo, uma questão técnica? Por outro lado, manifesta aquele que usa a forma 'Jeová' sentimentos melhores ou mais nobres do que aquele que usa as formas 'El-Shadday', 'Senhor' ou simplesmente 'Deus'? Não têm ambos a mesma intenção? Não têm em mente o mesmo ser, ou seja, o Deus Todo-Poderoso? Um segundo argumento de que a Sociedade Torre de Vigia lança mão é o de que 'Senhor' e 'Deus' não passam de títulos - há muitos 'senhores' ou deuses' (livro "Ajuda ao Entendimento da Bíblia" , p. 847). Todavia, esta é uma sutileza idiomática, pois, segundo o perito alemão Gesenius, na língua hebraica, a palavra 'adonay' - vertida em português como 'Senhor' - é aplicada exclusivamente a Deus. Em outras palavras, os judeus haviam criado uma forma alternativa, porém não comum, para o tetragrama. Ainda hoje, eles manifestam enorme reverência para com ela, reservando-a para ocasiões especiais - no cotidiano, preferem referir-se a Deus pela expressão "O Nome" ("ha'Shem"). Os termos para 'senhor' no sentido comum são adhoni ou adhon. Na própria Bíblia há exemplos do uso destes termos em sentido geral (o relato em I Samuel 1: 15, 26 é um deles), contrastando nitidamente com as passagens dirigidas a Deus. Eis aí a chave do problema - três palavras diferentes, mas uma só tradução. Para contornar o obstáculo lingüístico, muitos tradutores vertem o nome em versalete - 'SENHOR' -, indicando um termo específico na língua original. Quanto à forma hebraica plural 'Elohim', traduzida 'Deus' (embora, ao pé da letra, signifique 'deuses'), há um problema semelhante, pois ela não ocorre em qualquer outra língua semítica, nem mesmo no aramaico. Ademais, no primeiro capítulo de Gênesis, Deus é identificado apenas por este termo. Embora 'Elohim' raramente seja aplicado a deidades pagãs no Antigo Testamento, a forma como isso é feito difere significativamente - o vocábulo é seguido de verbo no plural, ao passo que, quando aplicado a Deus, o verbo ocorre no singular. Trata-se, pois, de uma construção bem peculiar, imperceptível em outras línguas. Diante destes aspectos, não é de estranhar que os tradutores modernos não se sentissem perturbados pelo uso dos termos correspondentes, 'Senhor' e 'Deus' - ambos consagrados pelos primitivos cristãos. No entanto, a comissão tradutora da TNM condena, de forma veemente, esta prática: "A maior indignidade que tradutores modernos causam a Autor divino das Escrituras Sagradas é a ocultação desse seu peculiar nome pessoal... Por usarmos o nome 'Jeová', apegamo-nos de perto aos textos da língua original e não seguimos a prática de substituir o nome divino... por títulos tais como 'Senhor', 'o Senhor', 'Adonai' ou 'Deus'. (TNM, p. 1501) São razoáveis as palavras acima? Foram os tradutores realmente 'indignos' ao traduzirem o nome divino por 'Deus' ou 'Senhor'? 'Apegou-se', de fato, aos textos da língua original a comissão tradutora da TNM por traduzir uma forma híbrida do tetragrama para uma forma popularmente aceita em uma língua gentia? Agiu ela de modo mais louvável do que os antigos copistas das Escrituras Sagradas, bem como outras comissões tradutoras de inúmeras versões da Bíblia? Um exame minucioso das evidências arqueológicas poderá lançar uma luz sobre o assunto. Antes de prosseguirmos, é importante enfatizarmos nosso objetivo: aferir o uso ou não do tetragrama pelos escritores do Novo Testamento. Onde procuraremos a resposta? Em nossas preferências teológicas? Em nossas convicções pessoais? Em nossa própria interpretação da Bíblia? Não, mas no inteiro conjunto de evidências arqueológicas de que dispomos. Cremos que, se o tetragrama estava presente no texto cristão, não é correto retirá-lo, mas, se não estava, não é correto inseri-lo.
Com a expansão do idioma grego pelo mundo, o Antigo Testamento - originalmente escrito em hebraico e aramaico - teve de ser traduzido para aquela língua. Muitos judeus haviam sido expatriados para Alexandria - centro da cultura grega desde 350 AC até sua sua conquista por Roma. Esses movimentos migratórios criaram uma nova situação - as gerações posteriores de judeus já não eram capazes de ler ou compreender o hebraico. Contudo, a influência helênica em sua cultura não se restringia à língua. A Dra. Karen Armstrong ajuda-nos a reconstituir o cenário da época: "Os judeus da Palestina e da diáspora foram envolvidos por uma cultura helênica que alguns achavam perturbadora, mas outros ficaram excitados com o teatro, filosofia, esporte e poesia gregos. Aprenderam grego, exercitaram-se no ginásio e adotaram nomes gregos. Alguns combateram como mercenários nos exércitos gregos. Até traduziram suas escrituras para o grego, produzindo a versão conhecida como a Septuaginta." - "Uma História de Deus" (1994), p. 76 Esta influência cultural também se estenderia, séculos mais tarde, à comunidade cristã, pois Clemente de Alexandria, Justino Mártir e Orígenes - considerados Pais da Igreja - foram grandemente influenciados pela filosofia grega. Assim sendo, por volta do 3o. século antes de Cristo, teve início a Septuaginta ou Versão dos Setenta Grega - representada, daqui por diante, pelo símbolo romano LXX. A tradução do Pentateuco (os cinco primeiros livros do Antigo Testamento) foi concluída por volta de 180 AC. No entanto, o trabalho completo de tradução das escrituras hebraicas só seria levado a termo no segundo século DC. Visto que diversas cópias da LXX provavelmente estavam disponíveis a Jesus Cristo e seus seguidores e que ela passou a ser, virtualmente, a 'bíblia' dos cristãos (mais do que os originais hebraicos) - sendo citada inúmeras vezes pelos escritores do Novo Testamento -, é mister conhecer o desenvolvimento desta relevante obra, produzida por peritos judeus, a fim de estabelecer qual o grau de uso do tetragrama nos tempos cristãos. Uma grande quantidade de cópias da LXX circulou entre judeus e gentios e algumas destas cópias existem até hoje. Que revelam estes documentos? Antes de prosseguirmos, é preciso que se esclareça um ponto de alta relevância - o Antigo Testamento, a LXX (sua tradução grega) e o Novo Testamento são obras distintas, produzidas em épocas diferentes e por culturas diferentes. O que é válido para uma, não necessariamente o é para as outras duas. Igualmente, o que é válido para duas pode não o ser para a terceira. Em razão disso, o grau de aceitação de cada uma não era o mesmo entre os povos antigos - como ainda não é para as diversas comunidades religiosas da atualidade. Alguns grupos têm sérias reservas para com a LXX, preferindo o texto massorético; outros rejeitam o Novo Testamento e ainda outros aceitam os três. Deste modo, estes escritos antigos têm de ser examinados individualmente. Se uma frase ou um termo são expressos de certa maneira no Antigo Testamento, esta frase ou este termo podem não estar expressos exatamente da mesma maneira na LXX (mesmo se tratando de uma tradução). Isto ocorre naturalmente na transposição entre quaisquer barreiras idiomáticas ou culturais. Ademais, se uma palavra é dita de certa forma no Antigo Testamento, não necessariamente a encontraremos assim no Novo Testamento, até porque os escritores cristãos não apenas davam, freqüentemente, preferência à cópia grega, quer dizer, a LXX, como também tomavam liberdades com os textos antigos, aplicando-os a contextos distintos ou tomando 'emprestado' apenas o estilo de escrita. Deveras, este modo livre de redigir dos cristãos foi duramente criticado por judeus conservadores da época. Eles já encaravam a tradução grega do Antigo Testamento com reserva e chegaram a acusar o cristianismo de distorcer passagens antigas das escrituras hebraicas, de modo a encaixá-las em suas doutrinas. Com efeito, incorre em equívoco grosseiro quem concebe o cristianismo como um movimento submisso aos costumes e tradições judaicas. Embora nascida do judaísmo, a igreja cristã - à exceção da corrente Ebionita -, jamais foi subserviente a ele. Por exemplo, na introdução da carta aos Hebreus, classifica-se o objeto de maior devoção dos judeus, a saber, a lei de Moisés, como mera 'sombra' das coisas futuras e aquém da realidade. O apóstolo Paulo reiteradamente enfatizou o livramento dos cristãos do jugo de tal lei (Gál. 3: 24, 25) Tais comentários do maior evangelista daquele tempo sintetizam bem a independência cristã da liturgia judaica. O tribalismo de um contrastava nitidamente com o universalismo do outro. A doutrina de Cristo, sem dúvida, parecia herética aos olhos dos 'doutores da lei'. Conseqüência direta - houve um cisma ideológico e social entre judeus e cristãos, o qual persiste até hoje. Concluímos, deste modo, que extrapolar conclusões acerca do conteúdo original de um antigo documento cristão a partir de uma fonte judaica anterior, na qual aquele supostamente se baseia, é um proceder tecnicamente desaconselhável e teologicamente arriscado. O procedimento mais seguro a ser adotado pelo investigador imparcial, neste caso, é examinar todo conjunto de achados arqueológicos, deixando que eles falem por si mesmos. Tendo em mente estes pontos, passemos a examinar o que as antigas cópias da LXX, hoje disponíveis, revelam sobre como os escribas vertiam o nome divino: I) Encontraram-se sete formas distintas pelas quais os copistas da LXX expressavam o nome sagrado. São elas: (1) simples transcrição do tetragrama em caracteres hebraicos ; neste caso, o texto inteiro era traduzido para o grego, mas o nome divino permanecia em hebraico, ; (2) tradução pela palavra grega knrioV - Kyrios, 'Senhor', em português - ou (3) sua abreviatura, ks ; (4) uma aproximação visual em grego, PIPI ; (5) uma aproximação fonética em grego, IAW ou (6) sua abreviatura, iw ; (7) transcrição do tetragrama em caracteres hebraicos arcaicos, . Embora as diversas formas acima não tenham a mesma idade, pois os caracteres hebraicos são os mais antigos, nenhuma delas esteve confinada a apenas uma era e diversas podiam ser encontradas simultaneamente, no mesmo manuscrito. Por exemplo, uma obra muito citada pelas Testemunhas de Jeová, um antigo e exaustivo trabalho de revisão bibliográfica, a Hexapla de Orígenes, inclui cinco das diferentes formas acima. Além disso, os rolos do Mar Morto - guardados pelos essênios - contêm a forma fonética grega IAW no livro de Ezequiel. Convém lembrar que os essênios constituíam um seita judaica que reverenciava o nome divino. II) Há fortes evidências de que os fatores determinantes da forma escolhida para representar o nome divino eram a origem do autor e o público-alvo. Cópias feitas por judeus e para judeus apresentariam o tetragrama em caracteres hebraicos, ao passo que aquelas feitas por gentios ou para gentios conteriam as formas correspondentes em grego. As evidências históricas indicam que as primeiras cópias da LXX - sendo destinadas, primariamente, ao povo judeu disperso - muito provavelmente seguiam a primeira opção, isto é, transliteravam o tetragrama hebraico. Todavia, isto não significa que seus usuários conhecessem a pronúncia do nome. Os judeus de língua hebraica há tempos referiam-se a Deus por adonay [Senhor]. O mesmo faziam os de língua grega, usando o termo correspondente, Kyrios. Neste respeito, o livro Ajuda ao Entendimento da Bíblia (p. 886, em inglês) - publicado pelas Testemunhas de Jeová - menciona as palavras de um erudito, o Dr. Paul Kahle, em sua obra The Cairo Geniza: "Nós sabemos que... [a Septuaginta] quando escrita por Judeus para Judeus, não traduzia o nome Divino por 'Kyrios', mas o tetragrama escrito em letras hebraicas ou gregas era retido em tais manuscritos. Foram os cristãos que substituíram o tetragrama por 'Kyrios', quando o nome divino escrito em letras hebraicas não mais era compreendido." (Grifo acrescentado) Com efeito, esta explicação leva-nos a um paradoxo, pois, se há - como sustentam as Testemunhas de Jeová - algo de herético ou imoral em verter o nome divino por 'Senhor', então, os cristãos primitivos teriam sido, eles mesmos, os primeiros culpados deste pecado. III) A ampla maioria das cópias da LXX que chegaram a nós apresenta a forma grega Kyrios. Há evidências de que isso se deveu a uma súbita mudança de atitude da comunidade judaica para com os cristãos. Após o devastador ataque romano de 70 DC, o antigo descontentamento judaico contra Roma aumentou vertiginosamente, culminando com com um levante fracassado, em 132 DC. O ressentimento dos judeus diante das conquistas do inimigo converteu-se em nacionalismo exacerbado e xenofobia. Além disso, quando, no quarto século, o imperador Constantino declarou-se convertido ao cristianismo, proclamando-o religião oficial do Império Romano, a reação judaica recrudesceu. Seus sentimentos adversos para com os romanos estenderam-se também aos cristãos, especialmente os judeus convertidos - considerados apóstatas. A LXX passou a ser vista, pejorativamente, como um compêndio 'cristão' - em outras palavras, uma tradução dos 'pagãos'. Na verdade, certos segmentos do judaísmo, desde longas datas, não a consideravam um documento fidedigno. Com o tempo, os judeus não só pararam de reproduzi-la, como buscaram destruir a literatura grega cristã. Entretanto, os cristãos gentios, não compreendendo símbolos hebraicos, continuaram a produzir cópias da LXX contendo a forma grega Kyrios. Isto aparentemente explica porque versões dela contendo o tetragrama tornaram-se tão raras.
A obra anteriormente mencionada - The Cairo Geniza - confirma isso ao dizer: "... após o Cristianismo ter se tornado a religião do Estado sob Constantino, os Judeus empenharam-se com sucesso em destruir sistematicamente toda a literatura [cristã], incluindo os textos gregos da Bíblia." (p. 246, em inglês) É importante ressaltar, em que pese a ampla popularidade da LXX, que ela não era a única tradução disponível. Precisamente em razão da mudança de atitude dos judeus em relação a ela foi que Áquila, Símaco e Teodócio publicaram suas traduções, por volta do segundo século depois de Cristo. Nessas obras eles reinseriram o tetragrama, tanto em hebraico comum como arcaico (opções 1 e 7 do item I). Um fato relevante a ressaltar é: tais tradutores não produziram essas obras por zelo cristão - ao contrário, eles eram judeus praticantes e opositores do cristianismo. Na verdade, pretendiam um retorno às raízes do judaísmo. Áquila (80-135 DC), por exemplo, converteu-se ao judaísmo, depois ao cristianismo e, então, de volta ao judaísmo. Enquanto membro da comunidade cristã, ele foi rejeitado por preservar práticas consideradas pagãs, como astrologia, magia e necromancia. Diz-se que ele chegou ao ponto de afirmar que Jesus era o "filho bastardo de Maria e um soldado romano loiro e de descendência germânica". Áquila tornou-se discípulo do rabino Akiva, enquanto Símaco era judeu convertido e Teodócio era prosélito. Além da reinserção do tetragrama, eles corrigiram, em algumas passagens, aquilo que consideravam falhas de tradução da LXX. Uma destas correções tem importantes conseqüências: a troca da palavra grega parthenos ('virgem') - presente na LXX - por neanis ('mulher jovem'), em Isaías 7: 14. O vocábulo original na bíblia hebraica é ha'almáh, significando 'a moça' ou 'a donzela', não necessariamente 'virgem' (betullah, em hebraico). Este detalhe acha-se registrado na nota de rodapé da TNM com referências (p. 844). Pode parecer uma diferença irrelevante, mas não é. Ela cria um sério problema, pois esta passagem sempre foi considerada, pelos cristãos, como uma alusão a Maria, mãe de Jesus, daí a natural preferência pelo termo 'virgem', empregado pela LXX e contestado de forma veemente por Áquila, Símaco e outros judeus daquele tempo. O livro de Mateus traduz a palavra hebraica da mesma forma que a LXX. Com efeito, as traduções de Áquila, Símaco e Teodócio atingem em cheio a idoneidade deste evangelho, pondo em xeque sua inspiração, pois sugerem que Mateus teria cometido um erro de tradução - intencionalmente ou por equívoco. Ainda assim, a Sociedade Torre de Vigia tem mencionado freqüentemente estas traduções - especialmente a de Áquila, considerada por alguns críticos como "literal demais", ao ponto de ser quase incompreensível - em apoio à teoria de que a LXX comumente usada nos tempos de Cristo, de fato, continha o tetragrama, e que ele e seus discípulos estariam, dessa forma, obrigados a usá-lo. Ademais, fragmentos de uma versão judaica da LXX, encontrados no Egito e datados como sendo do 1o. século antes de Cristo - os assim chamados papiros Fouad (ou LXXFouad) -, contêm o tetragrama e, por isso, têm sido enfaticamente apresentados pela organização como prova da mesma teoria. Tal atitude tem levado alguns estudiosos a considerarem as Testemunhas de Jeová como uma seita híbrida - misto de judaísmo e cristianismo. Se tomarmos em conta que a ampla maioria das cópias da LXX - incluindo-se aí as mais antigas obras completas (ou quase completas), tais como o códice Sinaítico, o Alexandrino e o Manuscrito 1209 do Vaticano, do 4o e 5o. século DC - não contêm o tetragrama, o achado de raras cópias de origem judaica que o contêm, como a LXXFouad , datando de antes de Cristo, aponta, no máximo, para uma possibilidade de as afirmações da Sociedade serem verídicas. Para que o leitor tenha uma noção numérica do problema, existem cerca de 1500 fragmentos da LXX que não dão suporte à tese da Sociedade Torre de Vigia e apenas uns 10 que lhe são parcialmente favoráveis (falaremos deles mais adiante). Todavia, essa disparidade numérica não parece exercer qualquer efeito sobre as convicções de seus dirigentes. Deveras, as Testemunhas de Jeová vão além, muito além disso: em razão da possibilidade aventada por sua teoria, elas não só sustentam que o tetragrama estava presente nas cópias da LXX disponíveis a Cristo e seus discípulos, mas afirmam categoricamente que ele também estava nos escritos originais do Novo Testamento. Para isso, propõem uma hipótese, no mínimo, 'policialesca' para o desaparecimento do tetragrama nos manuscritos do Novo Testamento dos séculos seguintes a Cristo, especialmente a partir do 3o século. Examinemo-la...
Em 1977, um eminente professor de religião da Universidade da Geórgia, EUA, George Howard, formulou uma teoria - publicada no Journal of Biblical Literature (Vol. 96, p. 63) -, a qual provocou grande empolgação entre os membros da Sociedade Torre de Vigia. Um trecho das declarações dizia: "Já que o tetragrama era ainda escrito em cópias da Bíblia grega [LXX] que compunha as Escrituras da igreja primitiva, é razoável crer que os escritores do Novo Testamento, ao fazerem citações da Escritura, preservassem o tetragrama no texto bíblico. Pela analogia da prática judaica pré-cristã, podemos imaginar que o Novo Testamento incorporava o tetragrama em suas citações do Velho Testamento." A declaração acima diz respeito a um fato bastante incômodo para aqueles que defendem a inclusão do tetragrama no Novo Testamento - nem uma única dentre as cerca de 5 mil cópias do Novo Testamento hoje existentes faz isso. O autor estava ciente do fato e não fez referência a qualquer manuscrito do novo Testamento dos primeiros séculos DC que contivesse o tetragrama. Não poderia, pois, até esta data, jamais se encontrou algum. E até que porventura se encontre, sua existência não passa de mera especulação. O enorme peso de tais evidências acaba por impor aos estudiosos cautela quanto a emitir um parecer órfão de evidência histórica, cautela essa bem evidente pela forma como o professor Howard apresenta suas idéias. Chamamos a atenção do leitor para as sentenças grifadas no trecho acima - expressões de incerteza -, pois elas 'recheiam' todo o artigo. Não poderia ser de outra forma, pois o autor, como um perito responsável, não se apressaria em tirar conclusões categóricas sobre uma matéria polêmica, apoiado em inferências e evidências meramente circunstanciais. Na verdade, ele conclui seu artigo prudentemente, na forma de cinco perguntas - nenhuma conclusão fechada. Todavia, a Sociedade Torre de Vigia parece não compartilhar da saudável cautela do autor. Na pág. 1504 da TNM, após transcrever parte da tese do prof. Howard - segundo a qual o tetragrama teria constado do Novo Testamento original, tendo sido posteriormente substituído por expressões como Kyrios (Senhor) ou Theos (Deus), ela declara: "Concordamos com o acima, com esta exceção: Não consideramos este conceito como 'teoria', mas como apresentação dos fatos da história quanto à transmissão dos manuscritos bíblicos." Para os autores das palavras acima, o poder da convicção parece ser o instrumento mais efetivo na tarefa de recompor a história. De fato, nenhum estudioso respeitável emitiria uma declaração hermética como essa sem por em risco sua credibilidade. Temos agora a oportunidade de conhecer a opinião do próprio autor da teoria sobre as afirmações das Testemunhas de Jeová. Indagado sobre essa postura com relação ao seu trabalho, o prof. Howard - em correspondência com um pesquisador sueco - respondeu: "As Testemunhas de Jeová foram longe demais com meus artigos. Eu não apoio as teorias delas."... Também nesta correspondência, o prof. Howard reconhece o enfraquecimento de sua teoria face à datação de um papiro do 1o. ou 2o. século DC, o qual não contém o tetragrama. Trataremos dessa questão posteriormente. A Sociedade Torre de Vigia acrescentou idéias conspiratórias à tese de George Howard, edificando sobre o arcabouço dela a sua própria teoria, descrita na TNM (p. 1505) da seguinte forma: "Em algum tempo durante o segundo ou terceiro século EC, os escribas eliminaram o tetragrama tanto da Septuaginta como das Escrituras Gregas Cristãs, e o substituíram por 'Kyrios', 'Senhor', ou 'Theos', 'Deus'. (Grifo acrescentado) Mal nenhum existe em propor uma hipótese, pois trata-se de um dos passos do método científico, os quais são: observação do fato, indagação sobre sua natureza, proposição de hipóteses, experimentação e estabelecimento de teorias. Na arqueologia a experimentação consiste no exame das provas materiais coletadas - pergaminhos, inscrições, monumentos, literatura etc. Se nossas conclusões hão de ser aceitas como plausíveis, não podemos nos furtar a este processo. Trata-se de uma ciência interpretativa - uma espécie de 'quebra-cabeças'. Mesmo assim, não deixa de ter princípios básicos. O investigador, ao deparar-se com uma nova evidência, busca encaixá-la no contexto de todas as descobertas anteriores. Às vezes, conceitos antigos precisam ser revistos. A elucidação do passado é, pois, um processo gradativo e requer prudência. Antecipar ou extrapolar conclusões à base de achados isolados ou elevá-las à condição de 'fato', violando princípios estabelecidos, dificilmente pode ser classificado como investigação isenta e confiável. Um exame das evidências históricas disponíveis permitirá ao leitor avaliar se a Sociedade Torre de Vigia seguiu cada uma dessas etapas - de forma coerente e científica - ao emitir as palavras acima. Vejamos...
Que Falem as Descobertas Arqueológicas Em 1947, um beduíno lançou uma pedra na abertura de uma caverna e ouviu um som semelhante a cerâmica quebrando-se. Após um exame, ele encontrou diversos recipientes contendo manuscritos muito antigos. Esta descoberta veio mais tarde a ser conhecida como os Rolos do Mar Morto. Hoje, existem cerca de 225 documentos originários deste sítio arqueológico, contendo as Escrituras Hebraicas, bem como comentários sobre os livros bíblicos. Algumas descobertas foram feitas assim - acidentalmente, por leigos. Outras foram procuradas por colecionadores de antiguidades e ainda outras por arqueólogos. As últimas décadas têm experimentado um acentuado crescimento no número de documentos históricos publicados e, conseqüentemente, um maior grau de conhecimento das civilizações antigas. Quais os principais documentos de que dispomos hoje e o que eles mostram quanto à presença do tetragrama nas Escrituras Sagradas? Com relação ao Antigo Testamento, temos o seguinte: a) Há 297 códices (cópias em formato de livro) e 1500 fragmentos de manuscritos antigos. A esmagadora maioria deles não contém o tetragrama. Além disso, quando o contêm, não apresentam um padrão uniforme de uso. No tocante a este último aspecto, os Rolos do Mar Morto, mencionados há pouco, são um exemplo contundente. Uma simples comparação entre algumas passagens deles e as de um outro manuscrito, séculos mais jovem - o Texto Hebraico dos Massoretas -, ilustrará o ponto em questão. Observemos a tabela abaixo:
Vemos, então, que nem mesmo os textos hebraicos mostram uma tradução padronizada, pois - nas mesmas passagens - alternam o uso do tetragrama e seus substitutos (Adonay e Elohim) de forma aleatória, mostrando que estes termos eram perfeitamente intercambiáveis entre si. Tais achados são consistentes com a hipótese da existência de diversos nomes para Deus - não apenas um - ou diversas formas de se dirigir a Ele - não apenas uma. b) A Sociedade Torre de Vigia localizou apenas 10 fragmentos de textos gregos do Velho Testamento contendo o tetragrama (TNM, p. 1503), vertido de cinco maneiras diferentes: caracteres hebraicos quadrados, hebraicos antigos, hebraicos arcaicos, duas letras hebraicas Iode e a forma grega fonética IAW (apresentada neste artigo como uma das 7 maneiras possíveis de verter o nome divino). São 6 fragmentos da LXX - indo do 1o. século AC ao 3o. século DC -, 1 códice do 9o. século e 3 fragmentos de Áquila e Símaco, os militantes do judaísmo anteriormente mencionados neste artigo. Note o leitor que, mesmo nos manuscritos citados pela Sociedade como prova de seu ponto, não há uniformidade na forma de verter o nome divino. Ela varia em função da época e local de origem. A Sociedade publicou uma figura na TNM (p. 1502), retratando três manuscritos, lado a lado, de modo a sugerir que eles têm uma origem comum. São eles: os papiros LXX Fouad (1o. século AC), o Códice Alexandrino (5o. século DC) e o Códice de Alepo (texto massorético do 10o. século DC)... Vistos assim, os manuscritos realmente parecem apoiar a tese das Testemunhas de Jeová. Mas, representa a figura acima uma analogia coerente? Corresponde a um fato estabelecido? Na verdade, a gravura acima pode facilmente induzir o leitor desinformado ao erro, pois apresenta como fato apenas uma dentre as inúmeras interpretações possíveis dos documentos arqueológicos disponíveis. E nem é a hipótese mais provável, por razões que analisaremos a seguir. De antemão, não percamos de vista o fato de que os três textos acima, além de provirem de culturas e períodos diferentes (envolvendo um espaço de onze séculos), referem-se a uma mesma passagem do Antigo Testamento. Logo, quaisquer conclusões elaboradas a partir destes manuscritos só serão válidas para as escrituras hebraicas, não fornecendo qualquer subsídio para a inclusão do tetragrama no Novo Testamento. Os fragmentos à esquerda (papiros Fouad) e à direita (Códice de Alepo) pertencem à cultura judaica - neles seria de esperar a inclusão do tetragrama. O manuscrito do centro (Códice Alexandrino) pertence à cultura cristã. Nele seria de esperar - como, de fato, ocorre - o termo "Kyrios" ("Senhor"). Apresentar tais documentos na disposição acima, como se pertencessem a um mesmo estilo literário, dá margem a uma série de questionamentos:
Apresentar seletivamente uma pequena fração das evidências, a qual parece favorável a uma tese, suprimindo um considerável montante de evidência contrária a ela e expor esta fração de uma forma a levar a uma única conclusão, quando na realidade pode levar a diversas - e ainda afirmando que esta conclusão não é teoria, mas um 'fato' -, dificilmente poderia ser classificado como uma atitude imparcial e intelectualmente honesta. Cremos que foi exatamente o que ocorreu aqui. Mais do que um produto de deliberação, trata-se de uma armadilha em que facilmente caem os adeptos do pensamento fundamentalista - a busca sôfrega por provas em favor daquilo em que se crê. A pressa em julgar as evidências em favor de um ideal pré-concebido. Em tais situações, não admira que a objetividade científica ceda lugar a conclusões parciais. Um ponto ainda precisa ser mencionado: a evidência precária fornecida pelas Testemunhas de Jeová proveria, no máximo, uma base para introduzir - nas traduções atuais do Velho Testamento - o tetragrama hebraico em si e não uma tradução de uma palavra híbrida (IHVH + adonay). Para seguir à risca o exemplo dos antigos copistas, como quer a Sociedade Torre de Vigia, as versões atuais da Bíblia deveriam conter e não 'Jehovah', 'Geova', 'Yahweh', 'Jeová' ou qualquer vocábulo semelhante. Se a reverência devida ao nome divino representava, naquele tempo, não traduzi-lo para língua alguma - nem mesmo para o grego, a língua mundial da época -, não há base, mesmo em face dos poucos documentos arqueológicos encontrados para, evocando a mesma reverência, substituirmos o tetragrama por um termo híbrido, incerto e estranho aos primitivos cristãos. Obviamente, isso criaria um problema de compreensão, o qual foi contornado pelos copistas cristãos por intermédio da introdução do vocábulo 'Kyrios' - este, sim, traduzível para qualquer língua. Compreensivelmente, foi o caminho adotado pela maioria dos tradutores atuais - aqueles a quem a Sociedade Torre de Vigia classificou como 'indignos'. Voltemos nossa atenção agora para o Novo Testamento: a) Existem atualmente 5309 manuscritos gregos do Novo Testamento - 267 Unciais, 2764 Cursivos, 2143 Lecionários, 88 papiros e mais 47 achados recentes. NENHUM DELES CONTÉM O TETRAGRAMA. A Sociedade Torre de Vigia reconhece este fato: "...nenhum antigo manuscrito grego dos livros de Mateus a Revelação hoje disponível contém o nome de Deus por extenso." - O Nome Divino que Durará para Sempre, p. 23 b) Não dispondo de alicerce arqueológico sólido sobre o qual apoiar suas inserções do tetragrama no Novo Testamento, a Sociedade recorre a dois artifícios: 1) insere o vocábulo 'Jeová' 112 vezes, em trechos do Novo Testamento que são citações ou alusões ao Velho Testamento, deduzindo que deveria estar lá e 2) faz mais 125 inserções arbitrárias com base em traduções hebraicas que vão do século 14 ao século 20. Ainda falaremos delas neste artigo. c) A Sociedade não esclarece seus leitores quanto a um aspecto crucial: o nome divino em hebraico fora, de fato, vertido por Kyrios - as razões nós já analisamos neste artigo. Porém a palavra Kyrios, encontrada em todos os manuscritos do Novo Testamento antigos, também foi - e arbitrariamente - substituída por alguma expressão como 'Jehovah' ou semelhante, segundo o entendimento pessoal do tradutor. Trata-se, pois, de uma via de "duas mãos", e não apenas uma, como a comissão tradutora da TNM busca fazer crer. Uma prova incontestável disso são as traduções hebraicas acima citadas, as quais, mesmo sendo obtidas de originais que não continham o tetragrama, permutaram a palavra original Kyrios por traduções híbridas do nome de Deus. Ainda assim, as Testemunhas de Jeová não tiveram escrúpulos quanto a lançar mão delas. No caso daquelas cópias e de suas derivadas, os supostos "restauradores" eram, eles mesmos, os adulteradores do texto original. d) A Sociedade também não esclarece que os cristãos primitivos adotaram uma nomenclatura própria para palavras sagradas, a qual veio a ser conhecida como Nomina Sacra. Tratava-se de um sistema peculiar, independente do vocabulário judaico. Como já mostramos, os editores da TNM, não hesitaram em acusar de 'indignidade' aqueles que não seguiram a mesma linha de conduta que eles. Lançaram sobre uma questão acadêmica uma medida de julgamento moral. Ao invés do critério científico, estava em jogo o caráter do tradutor. Todavia, um exame no critério adotado por cada lado permitir-nos-á avaliar se esta colocação é apropriada. Um exame dos princípios arqueológicos e do conjunto das provas revelará quem se deixou guiar por eles antes que por suas preferências teológicas.
A Sociedade Torre de Vigia parece estar bem ciente dos critérios de aferição do peso de uma evidência arqueológica. Embora não sejam perfeitos, eles asseguram que as conclusões sigam a direção para a qual o conjunto das provas aponta. Uma vez, surjam novas evidências, elas são inseridas neste contexto e servirão para reforçar as conclusões anteriores ou para enfraquecê-las. Infelizmente, a preferência teológica do investigador pode impeli-lo a ir na contra-mão das evidências ou pior - pode levá-lo a distorcê-las ou até corrompê-las. Um caso clássico é o da inserção, no texto de 1 João 5: 7,8, da expressão '...o Pai, a Palavra e o espírito santo; e estes três são um'. Encontra-se em dois manuscritos cursivos dos séculos 14 e 16 e em uma versão da Vulgata Latina. Aparentemente, foi uma alteração introduzida por trinitaristas convictos, os quais permitiram que a força da convicção sobrepujasse a honestidade intelectual. Como sabemos que se trata de uma adulteração? Em razão do enorme peso de milhares de outros documentos que não contêm essa expressão. Por meio desse exemplo, acabamos por tocar no primeiro critério - o numérico. "Quanto maior o número de evidências independentes em favor de uma hipótese tanto mais se considerará a hipótese como verdadeira" O princípio acima permite-nos hoje reconstituir, com grande margem de certeza, o conteúdo das Escrituras Sagradas. Eventuais discrepâncias podem ser dirimidas pela comparação com o inteiro conjunto dos documentos. A confiabilidade deste princípio é corroborada pelas palavras da própria Sociedade Torre de Vigia: "Qualquer que seja a versão das Escrituras Cristãs que você possua, não há qualquer razão para duvidar que o texto Grego na qual esta se baseia represente com considerável fidelidade o que os autores inspirados daqueles livros bíblicos originalmente escreveram. Embora estejam, agora, quase 2000 anos removidos do tempo de sua composição, o texto Grego das Escrituras Cristãs é uma maravilha de transmissão acurada." - A Sentinela de 1/4/1977, pág. 219 (em inglês) Não é senão o volumoso conjunto dos escritos antigos preservados que permite aos editores de A Sentinela fazerem esta declaração. Todavia, as Testemunhas de Jeová parecem não se dar conta de que violaram este mesmo princípio quando: - Insistiram em afirmar que as cópias da LXX contendo o tetragrama estavam disponíveis a Cristo e seus discípulos, dando maior peso a cerca de 10 fragmentos que pareciam apoiar essa tese e menosprezando os quase 300 códices e cerca de 1500 fragmentos contrários a ela. Neste caso, a preferência teológica sobrepôs-se às evidências concretas. Incidentalmente, a tese de que Cristo ao menos usasse a LXX ainda sofre severas críticas por parte de alguns pesquisadores. - Inseriram uma tradução para o tetragrama 237 vezes no Novo Testamento, desprezando completamente os mais de 5000 documentos arqueológicos antigos que não o contêm e dando mais peso a menos de 30 traduções hebraicas mil anos mais recentes do que os documentos mais antigos e completos de que dispomos. Por assim agirem, violaram também o segundo princípio. "...quanto mais velho o manuscrito bíblico é, tanto mais próximo dos originais é provável que esteja..." - A Sentinela de 15/3/1982, pág. 23 (em inglês) Perceba o leitor que é a própria Sociedade que está a definir este princípio. Dispomos hoje de um patrimônio arqueológico respeitável tanto quantitativa quanto qualitativamente. Existem milhares de documentos do Novo Testamento na forma de fragmentos de cerâmica, pergaminhos, papiros e códices, cobrindo períodos que vão desde 200 DC (ou, possivelmente, 81 DC) até poucas décadas atrás. Obviamente, os primeiros, estando mais próximos cronologicamente dos escritos originais, têm mais mais peso do que os mais recentes. É claro que há exceções a esta regra - uma delas é quando fica demonstrado que um documento, embora recente, deriva-se de uma fonte comprovadamente antiga e confiável. Os dados a seguir, mostram quão parciais foram os tradutores da TNM ao fazerem as 237 inserções do tetragrama no Novo Testamento.
Um aspecto adicional, omitido pelos tradutores da TNM, merece ser mencionado: estas traduções hebraicas foram feitas por comissões trinitaristas, com o objetivo precípuo de converter judeus ao cristianismo. Por esta razão, elas usam constantemente o tetragrama em sua obra, até mesmo em passagens do Novo Testamento que se referem claramente a Jesus Cristo. Utilizar seletivamente tais traduções hebraicas, como faz a comissão tradutora da TNM, com o intuito de distinguir as pessoas de Deus e Jesus Cristo, é um notável paradoxo, pois elas foram produzidas para fazer exatamente o oposto! Ademais, o próprio apêndice 1D contém um trecho, no qual a Sociedade confessa abertamente que os autores das traduções hebraicas em que a comissão da TNM se baseia para inserir 'Jeová' no Novo Testamento, não inserem o tetragrama apenas nas citações diretas do Antigo Testamento, mas, segundo as palavras dela própria, "TAMBÉM EM OUTROS LUGARES EM QUE OS TEXTOS EXIGIRAM TAL RESTABELECIMENTO". Infelizmente, esta lacônica declaração deixa "no ar" quais são estes 'lugares' e qual o critério adotado por aqueles autores para introduzir tais modificações. Com que autoridade tais tradutores tardios das escrituras cristãs inseriram nelas palavras que não se encontram em nenhum dos mais de cinco mil manuscritos antigos disponíveis? São tais traduções legítimas e confiáveis? O fato é que elas são tão tendenciosas quanto a própria TNM, pois abusaram da inserção do tetragrama com o propósito de fazer as escrituras cristãs apoiarem de forma generalizada uma doutrina pré-concebida - o trinitarismo. As Testemunhas de Jeová seguiram um caminho diferente - e não menos questionável - para negá-la. Nem mesmo diante de tais inconsistências colossais, a Sociedade Torre de Vigia modestamente reconheceu o caráter especulativo de suas teorias, mas apresentou-as como 'fato' além de qualquer dúvida e, como vimos, indiretamente rotulou os peritos bíblicos que discordavam dela de 'indignos'. A comissão tradutora da TNM - em sua firme determinação de inserir o nome 'Jeová' no Novo Testamento - acabou caindo em um terreno altamente pedregoso, o da exegese. É fato inegável que os escritores do Novo Testamento aplicaram à pessoa de Jesus Cristo palavras do Antigo Testamento, dirigidas exclusivamente a Deus. Se, de acordo com o que diz o apêndice 1D da TNM, ao encontrar uma citação do Antigo Testamento, o escritor "se veria obrigado a incluir fielmente o Tetragrama", então os tradutores da Sociedade criaram para si mesmos um sério dilema: se, nas passagens em que tais textos aplicam-se a Cristo, incluírem o tetragrama, estarão identificando a pessoa de Jesus com o Deus do Antigo Testamento, ou seja, endossando a doutrina da Trindade; se não o incluírem, estarão violando o princípio da fidelidade ao Antigo Testamento. Naturalmente, em razão de sua total rejeição teológica à referida doutrina, preferiram a violação deste último. Analisemos alguns exemplos: Em 1 Pedro 3: 15, referindo-se a Cristo, o apóstolo faz uma alusão a Isaías 8: 13, onde o profeta convida todas as nações a "Santificar o Senhor dos Exércitos" (Versão Rei Jaime). Porém, a Sociedade Torre de Vigia não ratificou a existência do tetragrama neste texto do Novo Testamento. O motivo - se assim o fizesse, endossaria a doutrina da trindade. No entanto, as traduções hebraicas de que falamos há pouco, de fato, permutam, nestas e noutras passagens, a palavra Kyrios [Senhor] por 'Jeová', ao contrário dos editores da TNM, os quais mantiveram o termo 'Senhor' - mesmo tratando-se de uma alusão ao Antigo Testamento. A própria nota de rodapé da TNM com referências (p. 1398, em português) confirma que tais fontes vertem o texto incluindo o nome divino: "Mas, santificai o Cristo como Jeová Deus em vossos corações..." (negrito acrescentado) A Sociedade Torre de Vigia preferiu traduzir o texto assim: "Mas, santificai o Cristo como Senhor em vossos corações..." (negrito acrescentado) É curioso ver uma entidade que combate tão ferrenhamente o uso do termo 'Senhor' em referências ao Antigo Testamento, defender o uso de tal termo toda vez que tais referências se aplicam a Jesus Cristo. Incidentalmente, a forma acima está coerente com os manuscritos antigos do Novo Testamento. Ao que parece, a comissão tradutora da TNM dá crédito a eles quando confirmam suas doutrinas. No entanto, é inaceitável proclamar a aderência a uma política de tradução formulada para preservar uma posição teológica, apenas para alterar tal política quando ela parece contrariar o mesmíssimo princípio que supostamente deveria apoiar. Examinemos mais alguns exemplos desta tendenciosa metodologia: No capítulo 10 do livro de Romanos, o escritor faz diversos pronunciamentos claramente alusivos a Cristo. A certa altura, no versículo 13, ele diz: "todo aquele que invocar o nome do Senhor [Kyrios] será salvo". A comissão da TNM inseriu, nesta passagem, o nome 'Jeová' em lugar da palavra 'Senhor'. Justificou isso por afirmar que o escritor estava citando o Velho Testamento - Joel 2: 32 -, de modo que estaria "obrigado" a transcrever o tetragrama. Ora, pelo contexto, a quem se referia o apóstolo Paulo? Se examinarmos a passagem, veremos que os versículos circundantes - 11 e 14 -, em plena harmonia com o tema iniciado a partir do versículo 4, parecem continuar a falar de Cristo. Aqui, a Sociedade Torre de Vigia, aparentemente, desconsiderou três possibilidades: 1) O escritor poderia estar citando a versão da LXX amplamente usada pelos cristãos daquele tempo, na qual o termo empregado é, de fato, 'Senhor' [Kyrios]. Admitindo a referência a Cristo, o uso deste termo, nesta passagem em particular, não ofenderia nem mesmo às convicções das Testemunhas de Jeová. 2) O escritor, mesmo ciente da existência do tetragrama no antigo texto hebraico, poderia estar fazendo uma citação informal dele, adaptando-o livremente à pessoa de Cristo. 3) O apóstolo podia estar intencionalmente identificando Cristo com 'IHVH'. Esta última hipótese é, a priori, descartada pelas Testemunhas de Jeová. Restam as outras duas, igualmente plausíveis. A segunda hipótese é fortalecida pelo comentário de um perito, publicado em uma nota de rodapé da TNM com referências, sobre outra passagem - a de 1 Pedro 2: 3. Lá, o apóstolo aplica Salmos 34: 8 a Jesus Cristo e nem por isso a comissão tradutora 'restaurou' o tetragrama, presente no texto original do Antigo Testamento - na prática, isto corresponde a uma admissão tácita de que a citação era informal. Ora, que garantia temos, então, de que não fosse este o caso também na declaração de Paulo? O mesmo princípio usado para introduzir 'Jeová' em Romanos 10: 13 poderia ser também aplicado à carta de Pedro. Ou o princípio que justificou o uso do termo 'Senhor' em 1 Pedro 2: 3 poderia ser aplicado à carta de Paulo. Tudo é uma questão de preferência do tradutor. Sendo, pois, uma questão polêmica, não seria mais razoável ceder aos manuscritos antigos, ao invés de tentar retificá-los? Examinemos agora outra passagem, ainda no livro de Romanos. No capítulo catorze e versículo onze, o escritor menciona Isaías 45: 23: "... pois está escrito: "'Por minha vida'", diz Jeová, ' todo joelho se dobrará diante de mim e toda língua reconhecerá abertamente a Deus'." - Romanos 14: 11, TNM Nenhuma cópia grega antiga do Novo Testamento contém o tetragrama nesta passagem. Da mesma forma, caso examinemos o texto do profeta Isaías, veremos que o versículo em questão também não o contém. No entanto, ele se encontra na TNM. A razão é óbvia - o contexto à volta do versículo mostra claramente que a declaração, sem dúvida, refere-se ao Todo-Poderoso. Assim, os tradutores da Sociedade Torre de Vigia sentiram-se justificados a inserir - contra toda a evidência dos manuscritos antigos - o nome 'Jeová' no lugar de 'Senhor' [Kyrios]. Por outro lado, em Filipenses 2: 10, 11, a mesmíssima passagem de Isaías é aplicada a Cristo: "... a fim de que, no nome de Jesus, se dobre todo joelho dos no céu, e dos na terra, e dos debaixo do chão..." - TNM
Tal texto não dá margem a controvérsia, pois o manuscrito grego contém o nome de Jesus, não a expressão 'Senhor'. Contudo, é curioso que, nesta passagem, a comissão tradutora não avise o leitor, por meio de notas de rodapé, que o referido texto é uma alusão direta ao profeta Isaías - agora com referência a Cristo. Este texto prova, sem sombra de dúvida, que os escritores do Novo Testamento faziam adaptações de textos do Antigo Testamento e que, portanto, inserir 'Jeová' no lugar de 'Senhor' em tais citações é um proceder temerário. A Sociedade Torre de Vigia critica a maioria das versões hoje disponíveis da LXX por elas seguirem o costume de empregar o termo 'Senhor' [Kyrios] em lugar do tetragrama. No entanto, dificilmente esta opinião foi compartilhada entre os escritores cristãos do primeiro século, pois eles citaram a LXX inúmeras vezes - inclusive em trechos que continham o termo 'Senhor' aplicado a Deus. Um exemplo clássico acha-se em Hebreus 1: 10, que, na TNM, diz: "Mas, com referência ao Filho:... 'Tu, ó Senhor, lançaste no princípio os alicerces da própria terra, e os céus são obras das tuas mãos...'" (negrito acrescentado) Trata-se de uma citação da LXX, no Salmo 102: 25, cujo contexto - a exemplo de Isaías 45: 23 - refere-se diretamente a "IHVH". Curiosamente, o vocativo "ó Senhor" não está presente no texto hebraico - trata-se de uma inserção tardia, feita por algum copista. Talvez este tenha se equivocado ou, quem sabe, tenha agido propositadamente. Erro ou não, o fato é que o escritor cristão - supostamente sob inspiração divina - endossou tal alteração. Em outras palavras, ele aceitou a referência a Deus, no Antigo Testamento, por 'Senhor'. Nesta passagem, é interessante que a comissão tradutora da TNM, fugindo à regra, não critique o copista da LXX por não incluir o tetragrama na inserção - preferindo o termo Kyrios - nem o apóstolo Paulo (supostamente o autor do texto) por concordar com o copista. A razão talvez se deva ao fato de este trecho particular da carta aos Hebreus aplicar-se diretamente a Cristo. A dubiedade da palavra "Senhor", providencialmente, permite o intercâmbio das pessoas a quem o texto se aplica - o que, neste caso, interessa aos unitaristas. Por outro lado, esta mesma ambigüidade é rejeitada quando ocorre em textos que parecem favorecer o trinitarismo (Romanos 10: 13, por ex.). A Sociedade Torre de Vigia tenta contornar a aparente discrepância por afirmar que a passagem é dirigível a Cristo por ele ter sido o 'mestre-de-obras' da criação. Deixa, desta forma, implícito que concorda com o uso do termo 'Senhor' nesta passagem do Novo Testamento. Todavia, esta opção inexoravelmente implica na aceitação do mesmo termo no Antigo Testamento, pois, como vimos, o texto em questão, ainda que alterado na LXX, origina-se dele (Salmo 102). Caso a comissão tradutora da TNM sugerisse que o copista deveria ter dado preferência ao tetragrama ou que o escritor de Hebreus deveria tê-lo 'restaurado' ao citar uma declaração que, afinal, referia-se originalmente a "IHVH" - e isto seria viável, já que, como dissemos, os autores do Novo Testamento freqüentemente referiam-se ao Antigo Testamento de maneira informal -, mais uma vez, seria endossado o pensamento trinitarista. O texto ficaria assim: "Mas, com referência ao Filho:... 'Tu, ó Jeová, lançaste no princípio os alicerces da própria terra, e os céus são obras das tuas mãos...'" - (negrito acrescentado) Evidentemente, a necessidade de negar a referida doutrina sobrepujou o princípio da 'fidelidade' aos termos ou ao sentido original do antigo texto hebraico. Fica patente, neste caso, que a preferência teológica moldou a TNM, antes que os manuscritos gregos propriamente ditos. Desta forma, parece-nos óbvio que o tradutor mais conveniente à erudição gramatical é aquele que não se sente ideologicamente incomodado por essa ou aquela forma de verter um versículo. Lamentavelmente, não foi o caso da comissão tradutora da TNM. Na edição de 1/2/1988 de "A Sentinela" (p. 5, em inglês), a Sociedade reconhece um fato que mencionamos repetidas vezes neste trabalho - os autores cristãos tomavam um certo nível de liberdade com o texto hebraico antigo (especialmente ao referirem-se a Jesus). A revista menciona "ligeiras alterações", bem como "omissões" por parte dos escritores. Diante das evidências textuais e históricas, bem como de acordo com esta admissão, insistimos que o procedimento mais seguro e academicamente honesto seria ratificar o conteúdo dos milhares de manuscritos disponíveis, ao invés de alterá-los com base em presunções incertas. A esta altura, fica claro que uma aplicação generalizada e sistemática do princípio de 'restauração' do nome divino nas escrituras cristãs, com base em citações do Antigo Testamento, é uma verdadeira 'faca de dois gumes' - ora nega a doutrina trinitarista, ora a confirma. Isto é bem evidente pelo fato de a Sociedade Torre de Vigia ser obrigada, em um texto ou outro, a abrir mão dele. Deveras, uma corrente doutrinária prefere uma forma de traduzir certa passagem, ao passo que a corrente contrária prefere outra. Qual das duas está correta? No fim, constatamos que a configuração final do texto sofre inevitavelmente a restrição de escrúpulos teológicos. Isto nos conduz a um ponto crucial da questão - dificilmente uma tradução da Bíblia escapa da influência pessoal do tradutor. Embora as traduções bíblicas guardem uma semelhança geral entre si, elas diferem em certos pontos-chaves nos quais a permissividade da gramática concede aos tradutores liberdade para selecionar as palavras mais condizentes com suas convicções. Isso pode dar origem a traduções sectárias: versões para trinitaristas, versões para unitaristas, versões para adeptos do judaísmo e assim por diante. Com efeito, a história nos tem mostrado que algumas versões da Bíblia foram elaboradas, não em razão de mudanças de língua ou em nome da erudição acadêmica, mas para fazer crer que as escrituras apóiam esta ou aquela ideologia. Um exemplo alarmante é o do ex-padre Católico convertido ao espiritismo, Johannes Greber, mencionado em A Sentinela de 1/10/1956. De acordo com o artigo, o Sr. Greber considerava a Bíblia "o mais destacado livro espírita" e, ao elaborar um tradução do Novo Testamento, esforçou-se ao máximo para que este "soasse bem espírita"! Ora, em que se apoiaria o autor para dar esta roupagem às Escrituras Sagradas, senão nos interstícios da gramática - manipulada com um fim pré-concebido? Ainda assim, a própria Sociedade lançou mão, anos mais tarde, desta mesmíssima tradução, como fonte de apoio para sua forma de verter o texto de João 1: 1 (livro Ajuda, p. 1245). É um quadro, deveras, inquietante. Outro exemplo, a Emphatic Diaglott - uma versão recomendada pela Sociedade Torre de Vigia -, é da autoria de um Cristadelfiano, Benjamin Wilson. Os Cristadelfianos são um movimento religioso cujas crenças assemelham-se bastante às das Testemunhas de Jeová. Temos aqui aquilo que se chama preconceito positivo, ou seja, a tendência de se aceitar facilmente as idéias provenientes de uma fonte com a qual se tem afinidade ideológica. Por outro lado, os grupos evangélicos dificilmente endossariam a tradução das Testemunhas de Jeová, tendo escrúpulos até mesmo quanto a usá-la em sua leitura pessoal - no seu todo ou em parte. Neste caso, manifesta-se o preconceito negativo - rejeitam-se a priori as idéias oriundas de uma fonte considerada não idônea. Entretanto, a Bíblia é um único livro! Acrescentamos, ainda, um aspecto revelador. A Tradução Interlinear do Reino, de acordo com a Sociedade, serviu de base para a TNM. Todavia, os dois compêndios apresentam um notável contraste na diversidade de formas pela qual traduzir uma palavra específica - Kyrios. Ela acontece 714 vezes no Novo Testamento. Transportá-la para outra língua, no entanto, não parece uma tarefa simples. Eis um resumo das ocorrências da palavra Kyrios e de suas diversas traduções. * Tradução Interlinear
* TNM
Muito embora a Sociedade Torre de Vigia afirme ter como base o texto grego da Versão Interlinear, percebe-se que os tradutores da TNM foram bem mais liberais na sua forma de verter uma única palavra - Kyrios. Um notável contraste com a afirmação inicial sobre "atribuir um só sentido a cada palavra principal e por reter este sentido tanto quanto o contexto o permitir". O que talvez passe despercebido é que, neste caso, se está diante de um conceito subjetivo - o contexto. Este termo parece às vezes um eufemismo para "interpretação" e é, em última análise, o que ele envolve. O processo geral de tradução do vocábulo Kyrios para a TNM parece ter sido o seguinte:
Um autêntico "filtro" ideológico! Dificilmente se poderia conceber um processo de "erudição" mais parcial do que este. Além de representar, essencialmente, a disposição de ajustar a tradução a uma teologia peculiar, despreza por completo a evidência arqueológica de mais de 5000 documentos! O quadro acima remete-nos à próprias declarações da Sociedade, no início deste artigo, sobre "tradições sectárias" e "incoerências ou traduções insatisfatórias" - faltas supostamente cometidas por outras equipes de tradução da Bíblia. As violações flagrantes dos princípios mais elementares de arqueologia - aqui demonstradas - levantam sérias suspeitas quanto a se não seriam eles próprios, os tradutores da TNM , aqueles a quem tais palavras melhor se ajustariam.
O Testemunho da História Secular As conspirações sempre fizeram parte da história humana. Algumas resultaram em quedas de governos ou até em assassinatos. A Bíblia relata diversas conspirações, sendo a mais grave delas aquela que resultou na morte de Jesus Cristo. Depois foi a vez dos judeus conspirarem contra Roma, gerando o levante fracassado de 132 DC. Não tardaria até que o império romano conspirasse contra os cristãos, resultando no massacre deles na forma de espetáculos públicos nas arenas. Seja como for, os desfechos das conspirações trouxeram freqüentemente mudanças drásticas no modo de vida de nações inteiras. Essa, por si mesma, constitui uma forte razão para as grandes conspirações da história terem sido fartamente registradas. Todos os eventos mencionados estão claramente documentados nos achados arqueológicos. Que dizer da suposta conspiração dos escribas no sentido de eliminar todo vestígio do tetragrama de todas as cópias existentes das Escrituras Sagradas? Teria sido uma tarefa exeqüível? Mais que isso, seria possível que tal manobra passasse completamente despercebida por todas as pessoas da época - especialmente pelos cristãos, os quais protegiam a Bíblia com sua própria vida? Analisemos os aspectos históricos. Sendo verdadeira a hipótese sustentada pelas Testemunhas de Jeová, seriam de se esperar as seguintes evidências históricas: 1) A maioria dos mais antigos manuscritos do Novo Testamento deveria exibir o tetragrama (ou um substitutivo como PIPI, IAW etc.) inserido no texto grego. Mesmo que houvesse uma forte disposição por parte de apóstatas no sentido de destruir estes manuscritos, essa atitude foi tardia e já deveria haver uma enorme quantidade de cópias espalhadas por três continentes. De modo que seria impossível destruí-las. A maioria talvez, mas não TODAS elas. Isso pode ser ilustrado no caso das cópias do Antigo Testamento - muito embora a maioria das cópias da LXX contenham a forma 'Kyrios', ainda assim umas poucas registram o tetragrama. O mesmo deveria se dar para com o Novo Testamento. Mas não é assim. Como já vimos, de 5309 cópias, NEM MESMO UMA MOSTRA ESSA CARACTERÍSTICA. 2) Deveria haver um período transicional, dentro do qual coexistiriam documentos de dois tipos - cópias do Novo Testamento contendo e cópias contendo knrioV. Supondo que, aos poucos, estabeleceu-se um consenso mundial em torno da adulteração - hipótese difícil de conjeturar -, deveria haver, entre os achados mais antigos uma maior quantidade do primeiro tipo e entre os mais modernos, do segundo. Os manuscritos costumavam ser guardados com muito zelo pelos cristãos. Muitos morreram protegendo-os. Para que se tenha uma idéia da longevidade destes documentos, Jerônimo, o qual morreu em 420 DC, relatou ter usado pessoalmente o evangelho de Mateus. Requer uma incrível dose de imaginação fantasiosa para propor que todos os cristãos adulteraram ou consentiram que suas cópias fossem adulteradas, de modo a não ter uma única sobrevivido até nossos dias. 3) Caso tivesse havido um movimento coletivo para a remoção do tetragrama do Novo Testamento, não há motivo razoável para supor que ela se daria logo após os escritos apostólicos. Uma adulteração tão prematura certamente suscitaria uma forte reação por parte da primitiva congregação cristã. Por exemplo, as últimas epístolas de Paulo foram escritas por volta de 61 DC. O último livro bíblico - Apocalipse - foi concluído em 96 DC e o evangelho de João, por volta de 98 DC. Ora, os manuscritos mais antigos são datados como tendo sido escritos por volta de 200 DC, o que os coloca a um século ou menos dos originais. Um deles, o papiro Chester Beatty pode ter sido escrito por volta de 81 DC. Isto significa que ele pode ter sido escrito uns vinte anos depois das cartas de Paulo e enquanto o apóstolo João ainda vivia. Apresenta ele alguma representação do tetragrama? NÃO! É a esse documento que o professor George Howard se refere em sua correspondência (já vista nesse artigo). Ele mesmo admite que esta prova enfraquece em muito a teoria do tetragrama no Novo Testamento. 4) Um testemunho importantíssimo estranhamente está ausente - o dos assim chamados Pais da Igreja. Este termo é universalmente aplicado a ilustres representantes da primitiva congregação cristã, os quais produziram inúmeros escritos sobre questões teológicas e históricas, após o período apostólico e entrando no período pós-niceno (referindo-se ao Concílio de Nicéia, em 325 DC). Podemos citar: Justino Mártir, Jerônimo, Orígenes, Irineu e outros. Eles viveram durante o período de consolidação da igreja cristã. Muito embora seus escritos não sejam canônicos, isto é, não são considerados inspirados, ainda assim revestem-se de grande valor histórico. A própria Sociedade Torre de Vigia tem se referido com freqüência a eles. Um exame do compêndio Aid to Bible Understanding [Ajuda ao Entendimento da Bíblia] revela citações sobre os trabalhos de Tácito e Josefo (p. 317), Orígenes (p. 456), Jerônimo (p. 520), Irineu e Eusébio (p. 640), bem como diversos outros. Pois bem, estes homens certamente estariam cientes de uma conspiração herética para apagar o tetragrama dos escritos sagrados, especialmente se percebessem que tal conspiração visava a confundir as pessoas de Deus e Jesus Cristo. Seus escritos, juntos, corresponderiam em volume a cerca de cinco Bíblias completas! AINDA ASSIM , NÃO CONSTA DELES UMA SÓ PALAVRA SOBRE TAL HERESIA. Por exemplo, Irineu foi autor de uma obra do 2o. século DC, chamada Contra as Heresias. Ao mencionar diversas passagens bíblicas onde os editores da TNM introduziram o termo 'Jeová', Irineu não demonstra qualquer apreensão quanto a uma heresia na aplicação do vocábulo 'Kyrios'. Na verdade, ele cita diversos desses versículos com plena aceitação da palavra 'Senhor'. Muito embora, alguns desses autores mencionassem a existência do tetragrama em certas cópias do antigo Testamento, nenhum deles jamais defendeu sua presença no Novo Testamento nem jamais mencionou um movimento para remoção herética do nome divino. É razoável presumir que, havendo tal conspiração, todos os Pais da Igreja fossem cúmplices dela por não fazerem nenhuma menção ou crítica a essa prática? 5) Escritos primitivos não-canônicos poderiam - e deveriam - mencionar a heresia da obliteração do tetragrama dos escritos sagrados. Mas não fizeram. Por exemplo, alguns manuscritos devocionais do 1o. século estão hoje à disposição da arqueologia. Um deles, a Epístola de Clemente aos Coríntios. Considera-se que seja da genuína autoria do companheiro do apóstolo Paulo, mencionado em Filipenses 4: 3. Foi escrita entre 75 DC e 110 DC. Este documento contém uma série de citações do Antigo Testamento, onde a TNM introduz o termo 'Jeová'. São citações de Ezequiel, Isaías, Josué e Salmos. Contudo, NÃO HÁ O TETRAGRAMA EM NENHUMA DELAS. Da mesma forma, outras epístolas não-canônicas, tais como a de Barnabé - cuja autoria é assunto de discussão -, seguem o mesmo padrão de Clemente. Seriam esses autores também cúmplices de uma conspiração mundial para eliminar todo e qualquer vestígio do tetragrama nas Escrituras Sagradas? Vemos, assim, que um exame minucioso na história primitiva deixa completamente órfã de alicerce a teoria da 'conspiração', proposta pela Sociedade Torre de Vigia. Fica claro o caráter meramente especulativo dela - uma questão de preferência teológica, nada mais. No que quer que as Testemunhas de Jeová tenham se apoiado para propô-la, certamente não foi nas evidências arqueológicas dos escritos bíblicos. As provas documentais são claras no sentido de que nenhum cristão hoje está obrigado a buscar uma transliteração do tetragrama a fim de exercer sua fé em Cristo. Tampouco o uso de um circunlóquio híbrido como 'Jeová' deve hoje servir de 'fetiche' aos cristãos como servia aos hebreus pactuados dos tempos pré-cristãos.
Comentário ao Evangelho de Mateus Na edição de 15 de Agosto de 1996 da revista A Sentinela, a Sociedade Torre de Vigia dá destaque a uma significativa descoberta - a obra de um médico judeu, datada como sendo do século 14. Ele identifica-se como Shem-Tob e produziu um compêndio sui generis. Trata-se do documento Even Bohan, o qual constitui-se de 17 seções. Em sua porção final, ele reproduz todo o evangelho de Mateus em hebraico. Até aí, nada de novo se não fosse por um aspecto - o professor George Howard apresenta evidência de que este compêndio pode ser uma revisão posterior dos próprios originais perdidos do 1o. século DC. Se esta teoria for verídica, o trabalho de Shem-Tob merece uma classificação à parte das demais traduções hebraicas. Há fortes evidências de que Mateus escreveu um evangelho em hebraico. Os escritos de Jerônimo, Irineu e Eusébio confirmam este fato. Dispor hoje de uma cópia que seja descendente direta dos manuscritos originais seria um fato grandioso. Certamente ajudaria a elucidar uma série de questões, inclusive o uso do tetragrama pelos escritores do Novo Testamento. Então, o que mostra o documento arqueológico de Shem-Tob? Confirma ele a tese das Testemunhas de Jeová? Bem, deixemos que a própria Torre de Vigia responda. Na seção "Perguntas dos Leitores" de A Sentinela de 15/8/1997, é formulada a seguinte pergunta: "É o tetragrama (as quatro letras hebraicas para o nome de Deus) encontrado no texto hebraico de Mateus copiado pelo médico do século 14 Shem-Tob ben Isaac Ibn Shaprut?" A Sociedade responde: "Não, não é. Entretanto, esse texto de Mateus usa 'hash-Shem' (escrito ou abreviado) 19 vezes... [o qual] significa 'o Nome', o que certamente refere-se ao nome divino... Assim, ao passo que o texto hebraico que Shem-Tob apresentou não usa o tetragrama, seu uso de 'o Nome'... apóia o uso de 'Jeová' nas Escrituras Gregas Cristãs." (Grifo acrescentado) Em parágrafos anteriores nós definimos 'circunlóquio' como sendo uma expressão pronunciável em lugar de uma impronunciável. É exatamente o que encontramos no texto hebraico de Shem-Tob - o circunlóquio, o qual significa 'o Nome'; ou, dito em outras palavras, se o texto de Shem-Tob, de fato, representa uma cópia fiel do evangelho hebraico de Mateus, somos forçados à conclusão de que o próprio Mateus não usou o tetragrama, mas uma expressão correspondente. Vimos, em nossas considerações anteriores, que havia duas formas de circunlóquio em hebraico, Adonay e Ehloim, e suas respectivas traduções em grego, Kyrios e Theos. O que o texto ora em apreço nos traz à atenção é mais uma forma de circunlocução. A linha de argumentação pela qual a Sociedade Torre de Vigia busca contornar o problema - além de subjetiva - parece contraditória. Vejamos: ela apresenta o uso do tetragrama hebraico por extenso em raras e antigas cópias da LXX como base para propor o uso obrigatório de uma expressão como 'Jeová', tanto no Antigo como no Novo Testamento. Por outro lado, reconhece que a pronúncia original perdeu-se; que a palavra 'Jeová' é uma espécie de 'sopa de letras' - a união das consoantes de um nome com as vogais de um circunlóquio; finalmente, reconhece que o evangelho de Shem-Tob não contém o tetragrama, mas um circunlóquio. Ainda assim, evoca este fato como justificativa para o uso de 'Jeová' nas Escrituras Gregas Cristãs. O texto de Shem-Tob confirma fatos já sabidos - que havia um nome cuja pronúncia havia se perdido e que se aplicavam expressões inteligíveis em seu lugar. O próprio Shem-Tob faz isso. Todavia, restam ainda dois aspectos: a) Este texto pretende ser um descendente direto dos escritos hebraicos de Mateus. Isso leva a uma questão: se no texto mais apropriado para transcrever por extenso - o texto hebraico - Mateus preferiu o uso da abreviação de um circunlóquio, que expressão teria ele usado na versão do evangelho mais conhecida pelos cristãos, em grego? É provável que escrevesse o tetragrama por extenso quando não o fez na versão hebraica? b) Mesmo supondo que o uso do símbolo, de alguma forma, justifique a inserção do vocábulo 'Jeová' no Novo Testamento, um exame mais detido revela que o índice de coincidência entre as inserções da TNM e as aplicações da expressão 'o Nome' no texto de Shem-Tob é de 65%. Das 23 ocorrências de 'Jeová' na TNM, apenas 15 coincidem com a expressão substituta do outro texto. Dito de outra forma, há passagens em que Shem-Tob usa o circunlóquio e a TNM não usa 'Jeová'. Por outro lado, há passagens em que o ocorre o oposto - a TNM emprega 'Jeová' e Shem-Tob não usa o símbolo. Este fato apenas acrescenta mais peso à afirmação de que a Sociedade Torre de Vigia aplicou um método arbitrário e impreciso ao inserir, sem base arqueológica, a palavra 'Jeová' no Novo Testamento. Um último detalhe referente a Mateus chama a atenção dos peritos e parece pertinente: é notável a relutância dele em utilizar a expressão 'Reino de Deus' - bastante comum nos outros evangelhos -, usando repetidamente a forma 'Reino dos Céus'. Peculiaridades como essa levam-,nos a cogitar se Mateus tinha ou não escrúpulos quanto à transcrição do tetragrama, preferindo um circunlóquio como 'o Nome' ou outro. De qualquer forma, qualquer evidência arqueológica direta nesse sentido está hoje perdida. Todavia, se tomarmos como parâmetro o texto hebraico de Shem-,Tob, somos levados a crer que Mateus também não usava o tetragrama, preferindo dizer 'O Nome' - expressão esta empregada até hoje pelos judeus ("ha'Shem").
O corpo das evidências escriturais e históricas, até esta data, constitui um seriíssimo obstáculo às pretensões dos membros da comissão editorial da TNM como genuínos "restauradores" do nome divino nas Escrituras Sagradas. Entretanto, assumamos, por um instante, que as 237 inserções de 'Jeová' no Novo Testamento sejam, de algum modo, apropriadas. Ainda assim, deparamo-nos com um quadro curioso e difícil de explicar - a fenomenal redução das menções do tetragrama no Novo Testamento. Mesmo na TNM, onde houve um enorme esforço - contra todas as evidências arqueológicas - para inserir o termo 'Jeová' tanto quanto fosse possível, é visível a discrepância quanto ao uso do tetragrama nos tempos pré e pós-cristãos. A título ilustrativo, observemos o gráfico abaixo, no qual consta o número de ocorrências de 'Jeová' em cada um dos 66 livros bíblicos da TNM. Para facilitar o entendimento, representamos as barras relativas ao Antigo Testamento em verde e ao Novo Testamento, em vermelho.
Ao observar o gráfico, percebe o leitor a diferença no padrão de uso do tetragrama no Antigo Testamento em relação ao Novo Testamento? Mostra esse último um modelo de "restauração" do nome ou exatamente o contrário? A imagem fala por si... Deveras, a partir da análise acima, é difícil não notar o acentuado contraste entre o Antigo e o Novo Testamento no que se refere às ocorrências do nome 'Jeová' - mesmo na TNM. Ao passo que o nome manifesta-se com grande freqüência nos livros de Gênesis a Malaquias -apesar de algumas exceções -, vemos que sua ocorrência diminui vertiginosamente a partir do advento do cristianismo, chegando quase a desaparecer, mesmo na tradução das Testemunhas de Jeová! À base desse estudo e da consulta das próprias escrituras, concluímos ainda que: a) Apresentar o tetragrama não é requisito para um livro ser considerado divinamente inspirado (ou canônico), pois, no antigo Testamento, ele está completamente ausente em 3 livros - Ester, Eclesiastes e Cânticos de Salomão - e, no novo Testamento, em 7 livros - Filipenses, 1 Timóteo, Tito, Filêmon, 1, 2 e 3 João. Apesar de todo o esforço, nem mesmo a Sociedade Torre de Vigia conseguiu inserir 'Jeová' nestes 10 livros bíblicos. b) Se, ao invés de números absolutos, considerarmos a freqüência com que o nome aparece nas páginas de cada livro, chegaremos igualmente a grandes disparidades. Para ilustrar, no Antigo Testamento, temos uma média acima de 6 ocorrências por página (6,2) ; no Novo Testamento, temos menos de 1 ocorrência (0,8) . Mesmo com as 237 inserções de 'Jeová'! c) Ao passo que, mesmo na versão das Testemunhas, a freqüência do nome 'Jeová' cai vertiginosamente no Novo Testamento, o nome 'Jesus' aparece 912 vezes, ou seja, 3 ocorrências por página, em média; o nome 'Cristo' aparece cerca de 530 vezes. Deus é chamado 'Pai' 260 vezes, ou seja, 23 vezes a mais do que 'Jeová'. d) Os apóstolos de Cristo referiram-se ao Criador como 'Deus' 1275 vezes, ou seja, mais de cinco vezes o número total de ocorrências de 'Jeová' na TNM; outras 22 vezes, eles falaram 'Senhor Deus' e mais umas 40 vezes, 'Deus Pai'. e) O advento do cristianismo, conforme mostra o gráfico, não fez renascer o uso do tetragrama - este continuou em franco desuso entre os cristãos, como já estava, há diversas gerações, entre os judeus. Entretanto, no apêndice 1D da TNM com referências, a Sociedade Torre de Vigia afirma que Jesus, ao ler um trecho de Isaías dentro de uma sinagoga (Lucas 4: 17, 18), deparou-se com o tetragrama e, por isso, pronunciou o nome divino. Esta é uma afirmação incerta, pois, mesmo que o rolo em questão contivesse o tetragrama, o fato é que não temos como saber como Cristo o pronunciou naquele momento. Como dissemos anteriormente, as evidências históricas demonstram que a pronúncia exata já havia se tornado incógnita entre os judeus daquela geração, sendo costume secular o de referir-se a Deus por 'Senhor', mesmo diante das quatro letras hebraicas. Assim sendo, para nos certificarmos do termo escolhido por Jesus, nesta e noutras ocasiões, bem faremos em examinar como ele se referiu ao Todo-Poderoso no decorrer de seu ministério. Este durou cerca de três anos e esteve repleto de discursos - fontes preciosas de informação. O que mostram as evidências? Elas parecem estar em choque com a tese das Testemunhas de Jeová, pois, em nenhuma de suas orações, Jesus Cristo dirigiu-se a Deus como 'Jeová' - nem mesmo na oração-modelo -, mas sempre como 'Pai'. Em seu sermão do monte - no qual não há registro arqueológico de um único uso do tetragrama -, ele combateu fortemente as tradições judaicas que anulavam a palavra de Deus. Contudo, não emitiu qualquer palavra sobre uma suposta heresia para apagar ou diminuir a importância do nome de Deus. Na última noite, antes de sua prisão e morte, ele referiu-se ao nome de Deus 4 vezes, sem contudo mencionar 'Jeová' uma única vez. Na verdade, ele usou a palavra 'Pai' cerca de 50 vezes! Se, como afirmam as Testemunhas de Jeová, Cristo usou amplamente o tetragrama, por que se dá que é tão difícil localizar uma passagem do evangelho em que ele possa ter feito isso? Se, pela declaração dele em João 17: 6, 26, "dar a conhecer o nome" de Deus significava pronunciar o tetragrama em tantas ocasiões quanto fosse possível fazê-lo, por que permanece a disparidade entre Antigo e Novo Testamento quanto a esta prática? Tivesse a glorificação do tetragrama, acima de todos os nomes (ou sua "restauração"), constituído parte da missão de Cristo, o gráfico acima levar-nos ia à inevitável conclusão de que ele fracassou completamente neste respeito. É essa hipótese aceitável aos cristãos? Após o exposto acima, indagamos: é razoável insistir no uso de uma palavra híbrida como 'Jeová' - a título de reverência a Deus -, quando todas as evidências arqueológicas e históricas do cristianismo apontam para outra direção? Teriam Jesus e seus discípulos 'apostatado' da fé por procederem de forma diferente daquela hoje pregada pelas Testemunhas de Jeová? E quanto ao apóstolos Paulo e João? Em 4 cartas de Paulo e nas 3 de João o tetragrama está completamente ausente. Naturalmente, isto seria impensável para os padrões atuais entre as Testemunhas. Teriam aqueles escritores cristãos também 'conspirado' para diminuir a importância do nome de Deus? Não é nosso objetivo expor todo o assunto em termos meramente matemáticos, pois a teologia não é ciência exata e transcende em muito às análises puramente numéricas. Por outro lado, tendo-se em conta a freqüência com que o nome 'Jeová' aparece, tanto na literatura como no cotidiano das Testemunhas de Jeová, bem como a ênfase que elas dão a essa prática como identificadora dos verdadeiros cristãos, julgamos procedente checar o padrão cristão primitivo nestes mesmos termos - uma análise estatística. Se acrescentarmos aos números acima os 297 códices e cerca de 1500 fragmentos do Velho Testamento mais os 5309 manuscritos do Novo, todos sem apoio algum à inserção do nome híbrido 'Jeová' na Bíblia, fica-se a imaginar qual a raiz da obstinação com que os dirigentes da Sociedade Torre de Vigia empreendem sua 'cruzada' em torno desta questão. Um exame na história da organização talvez ajude a elucidar o fato.
A Sociedade Torre de Vigia e o Tetragrama
O fundador do movimento religioso hoje conhecido como Testemunhas de Jeová - Charles T. Russell - não dava ênfase ao uso de um nome como o meio identificador dos verdadeiros cristãos. Na verdade, tivesse ele vivido para ver o que ocorreria em 1931, dificilmente manifestaria sua aprovação. Naquela data, seu sucessor, J. F. Rutherford, resolveu adotar para os então "Estudantes da Bíblia" o nome distintivo de "Testemunhas de Jeová". Isso representava um grande contraste com o entendimento do 'pastor' Russell, expresso na revista Watch Tower [A Sentinela] de Abril de 1882, pp. 7 e 8: "Já que você saberia por qual nome distinguir-me dos outros, eu lhe digo que eu seria, e espero ser, um Cristão; e escolho, se Deus por acaso tiver-me como merecedor, ser chamado um Cristão, um crente, ou qualquer outro nome que seja aprovado pelo Espírito santo. Quanto àqueles títulos facciosos (ou sectários) como Anabatista, Presbiteriano, Independente, ou coisa semelhante, eu concluo que eles não vieram de Antioquia nem de Jerusalém, mas do inferno e de Babilônia, pois eles tendem a divisões; você poderá conhecê-los por seus frutos." (Grifo acrescentado) No ano seguinte, ele acrescentaria: " 'Cristãos´ é o único nome pelo qual precisamos ser chamados."
- A Sentinela de março/abril de 1883, p. 458
(em inglês) A postura de Russell era clara. A adoção de um nome distintivo não só era desnecessária, mas potencialmente perigosa, podendo dar margem a sectarismo. Não se pode negar que essa opinião parecia mais de acordo com o relato bíblico, segundo o qual os seguidores de Jesus foram chamados 'Cristãos' "por providência divina" (Atos 11: 26). Todavia, o ano de 1918 testemunharia uma mudança dramática no movimento dos "Estudantes da Bíblia". O recém-empossado presidente Rutherford tomara duas medidas escandalosas para a comunidade dos adeptos: na edição de A Sentinela de 1/6/1918 e em sua reimpressão ele convocava os cristãos a unirem-se ao país num dia de orações pela vitória aliada na I Guerra, bem como os autorizava a adquirir bônus de guerra. Estes atos ocasionaram uma grande rachadura na organização - um grupo destacou-se e criou seu próprio movimento, conhecido como Standfasters [Intransigentes]. Com o passar do tempo, outros grupos dissidentes se formaram, de modo que a designação "Estudantes da Bíblia", ou mesmo "Cristãos", eram títulos de pouco significado quanto a quem exatamente se referiam. Havia Batistas, Pentecostais, Católicos, Adventistas e diversas facções de ex-Estudantes da Bíblia. Como distinguir-se deles? Foi dentro deste cenário efervescente que surgiu o nome "Testemunhas de Jeová", extraído arbitrariamente de uma passagem do profeta Isaías, proferida cerca de 700 anos antes de Cristo e dirigida à nação de Israel, sob lei mosaica (Isaías 43: 10-12). O nome apresentava duas conveniências: primeiro, distinguia os membros da Sociedade Torre de Vigia dos movimentos dissidentes e, segundo, criaria o ensejo para as Testemunhas de Jeová aplicarem a si mesmas todas as passagens bíblicas que contivessem os termos 'testemunha' ou 'testemunhar'. Uma observação simples no compêndio Proclamadores, capítulos 1-3, mostra claramente esta prática: todos os servos antigos de Deus até Jesus Cristo são chamados de 'testemunhas de Jeová' - obviamente com a intenção de criar, na mente do leitor, um vínculo histórico entre a entidade atual e tais personagens bíblicos. A comunidade dos Estudantes da Bíblia da época não participou do processo de criação do novo nome. Foi um trabalho individual, produto da mente de um só homem - Joseph F. Rutherford -, o qual o anunciou em meio a um clima de euforia, diante de uma platéia gigantesca e favoravelmente disposta às suas palavras, criando uma atmosfera de êxtase semelhante àquela comumente encontrada entre os assim chamados grupos carismáticos. Com efeito, o livro Proclamadores (p. 82) relata que os espectadores "pularam de seus assentos com um retumbante: 'Sim!' ". Evidentemente, sob tal circunstância, qualquer que fosse o nome sugerido, a resolução seria bem recebida pela assistência. E foi a partir deste portentoso acontecimento, ou seja, da adoção deste nome que a ênfase ao uso do tetragrama gradativamente cresceu entre os adeptos, passando a ocupar o nível de 'sintoma' identificador do verdadeiro povo de Deus, prerrogativa que, obviamente, a organização reserva para si, não importando o quanto outras entidades usem ou tenham usado uma expressão equivalente. Segundo a obra In Search of Christian Freedom [Em busca da Liberdade Cristã], 1999, um exame nos primeiros 40 anos da revista A Sentinela não revela uma freqüência de ocorrência do nome 'Jeová' muito maior do que aquela de outros compêndios religiosos da época ou anteriores. Um exemplo notável é o da edição de 15 de abril de 1919, o qual só continha o nome uma única vez em toda a revista! O conteúdo de outras publicações - posteriores a 1919 - é revelador. Vejamos o que afirmavam algumas obras da autoria de Rutherford sobre o nome 'Jeová': "A Bíblia demonstra que o nome de Quem exerce poder supremo na criação em e em todas as coisas é Deus. Ele também tem outros nomes que se encontram na Bíblia, todos os quais têm um significado profundo acerca de seu propósito para com as suas criaturas." - Criação, 1927, pág. 10 "A significação dos nomes ou títulos encontrados na Bíblia é de muita importância. O nome 'Deus' quer dizer o Altíssimo. O nome 'Jeová' significa os propósitos do Eterno para com suas criaturas. O nome 'Deus Todo-Poderoso' quer dizer que o seu poder é ilimitado. O nome 'Altíssimo' dá a entender que ele é o Supremo e que, além dele, não existe nenhum outro."
- Riquezas, 1936, pág. 135
"O Criador é o Imortal, de eternidade a eternidade, e o nome Dele é Deus.... "Deus" significa o Todo-Poderoso...; "Senhor", significando supremo Governador; "Jeová", significando seu propósito para com suas criaturas; "Pai", significando doador de vida; e "Altíssimo", o que é sobre tudo." - Inimigos, 1937, pág. 22 Incidentalmente, as explanações acima estão em pleno acordo com o pensamento das denominações evangélicas atuais, as quais entendem que, de fato, Deus manifestou-se à humanidade por diversos nomes: os genéricos - El (Deus), El-Elyon (Deus Altíssimo) e Elohim (Deus) - e os específicos - El-Shadday (Deus Todo-Poderoso ou Deus da Montanha), Adhonay (Senhor) e Yahweh (Eu Sou). Paradoxalmente, na mesma época dos escritos acima, Rutherford fez, em outra de suas publicações, uma declaração, no mínimo, assombrosa e contraditória: "A vindicação do nome de Jeová...[é] agora mais importante do que o amor de Deus ao homem por meio de Cristo." - Jeová, 1934, pág. 320 As três primeiras declarações de Rutherford representam notável contraste com os ensinos atuais da Sociedade Torre de Vigia, ao passo que a última, em que pese seu contraste com a mensagem real do Novo Testamento, parece estar mais de acordo com o entendimento atual das Testemunhas de Jeová. De fato, além de negar que 'Deus', 'Pai' ou 'Senhor' sejam as expressões ideais pelas quais o cristãos devam se dirigir ao Criador, a Sociedade - em uma matéria sobre seus cânticos de louvor - acrescenta: "No cancioneiro publicado pelo povo de Jeová em 1905, havia duas vezes mais cânticos louvando a Jesus do que havia em louvor a Jeová Deus. No seu cancioneiro de 1928, o número de cânticos que exaltavam a Jesus era mais ou menos o mesmo que os que exaltavam a Jeová. Mas no último cancioneiro, de 1984, Jeová é honrado com quatro vezes mais cânticos do que Jesus.
Revelação - Seu Grandioso Clímax está Próximo,
1988, p.36 Se considerarmos o padrão do novo Testamento, vemos que o hoje vigente entre as Testemunhas de Jeová corresponde exatamente ao inverso daquele dos cristãos do 1o. século - mesmo na TNM -, o quais faziam referências a Jesus Cristo muitas vezes acima de qualquer outro nome, inclusive o tetragrama, se é que alguma vez o utilizaram. Na edição de 8 de maio de 1985 da revista Despertai!, a Sociedade Torre de Vigia declara: "É lógico que [Deus] supervisionasse a transmissão fidedigna de sua Palavra até o presente dia." Considerando que esta afirmação seja verdadeira e que nem uma única cópia contendo o tetragrama sobreviveu, somos forçados a concluir que, de fato, o tetragrama jamais foi mencionado no Novo Testamento. Asseverar o contrário seria admitir que a mão dos copistas apóstatas, empenhados em ocultar o nome divino foi mais poderosa do que a mão de Deus, empenhado em fazer com que sua Palavra fosse transmitida a nós da forma mais precisa possível. Um último aspecto merece destaque: as versões bíblicas adotadas pela Sociedade Torre de Vigia ao longo de sua existência. Também nesta área teremos surpresas... Em 1901, uma versão bíblica chamada American Standard Version [Versão Padrão Americana] introduzia o nome 'Jeová' milhares de vezes nas escrituras. Ainda assim, a Sociedade Torre de Vigia não a prestigiou com menções em sua literatura. Seguindo o costume anterior, continuou a usar como tradução básica a King James Version [Versão Rei Jaime], a qual veria o nome divino por 'Senhor'. Décadas depois, em 1944, a Sociedade adquiriu o direito de impressão sobre aquela versão de 1901. Ainda assim, embora ocasionalmente a mencionasse, continuou a usar a Versão Rei Jaime como a tradução padrão de suas citações. Esta situação perdurou até 1950, com o lançamento da Tradução do Novo Mundo, usada até hoje. Além disso, a Tradução Interlinear do Reino, publicada pela Sociedade em 1969 e 1985, não contém o nome 'Jeová' e suas referências de rodapé dão mais apoio ao uso da palavra 'Senhor'. A partir desse quadro, é razoável supor que se o uso do nome 'Jeová' sempre foi imperativo, a entidade demorou consideravelmente para tomar providências nesse sentido, pois dispunha, por quase 50 anos de uma versão bíblica que já utilizava o nome em suas páginas, sem no entanto dar preferência a ela em suas citações. Quanto à própria TNM, há ainda uma inconsistência difícil de justificar: a introdução afirma que, para o Novo Testamento, tomou como base o texto de Westcott e Hort. Contudo, no referido texto não consta o tetragrama. Além disso, na nota de rodapé de Lucas 23: 43, também deixa claro que não seguiu tal texto. Em outras palavras, a comissão está - na prática - admitindo que sua tradução é, na verdade, uma miscelânea. Assim: adota-se como 'esqueleto' um texto básico, reproduzindo-o fielmente onde ele não entra em conflito certas preferências teológicas. Onde isso acontece, soluciona-se o problema por introduzir paráfrases, termos questionáveis sob a ótica da erudição gramatical e "enxertos" de outras traduções, separadas por séculos umas das outras. Talvez essa metodologia nada ortodoxa tenha contribuído para fazer da TNM uma versão pouco prestigiada entre os eruditos. Deveras, não se tem notícia de qualquer comunidade religiosa ou acadêmica que dê preferência a esta versão, a não ser a comunidade das próprias Testemunhas de Jeová!
Como mencionamos no início deste artigo, a comissão editorial da TNM recomenda-se a si própria por ter "restaurado" o nome divino ao seu devido lugar. Nesta seção, apresentamos alguns fatos históricos que parecem contradizer esta afirmação: 1) Diversos escritores e denominações religiosas têm, ao longo dos séculos, usado traduções do nome divino. Grupos antigos conhecidos como "Assembléias de Yaweh" criaram versões da Bíblia onde o nome divino aparecia, no Novo Testamento, em número superior àquele da tradução das Testemunhas de Jeová. 2) O nome divino é encontrado em cancioneiros protestantes seculares, comentários bíblicos e monumentos antigos. 3) Já no século 17, a tradução da Bíblia Espanhola de Cipriano de Valera verteu o nome divino por 'Jeová' milhares de vezes, assim como traduções missionárias do século 19. 4) Diversos ramos dissidentes das Testemunhas de Jeová, embora menos conhecidos, usam regularmente o nome 'Jeová'. À base das evidências acima, vemos que a pretensão das Testemunhas de Jeová como "restauradoras" do nome divino é inconsistente, pois, por ocasião do surgimento de sua entidade, ao final do século XIX, simplesmente não havia o que "restaurar". O termo por elas empregado (ou outros semelhantes) já era conhecido e divulgado através de literatura religiosa e histórica muito antes de Charles T. Russell - o fundador do movimento - ter nascido. Além disso, caso fosse considerado válido o argumento da Sociedade Torre de Vigia, de que "restaurar" o nome divino é 'sinal' identificador dos "verdadeiros cristãos", as Testemunhas de Jeová teriam que compartilhar este invejável título com diversos grupos religiosos surgidos ao longo da história, sob diferentes lideranças e oriundos de diversos lugares ao redor do mundo. Todavia, como já dissemos, elas tem reservado tal prerrogativa apenas para sua própria comunidade. Em nenhuma parte das Escrituras está previsto um ressurgimento da verdadeira adoração de Deus à base da "restauração" de um nome. Neste respeito, o apóstolo Paulo, mencionando as diversas deidades existentes entre os gregos e romanos, destaca a identidade do único Deus verdadeiro, não por "restaurar" o tetragrama ou uma tradução dele, mas por dizer: "Pois, embora haja os que se chamem 'deuses'..., para nós há realmente um só Deus, o Pai - 1 Coríntios 8: 5,6 Paulo, aqui, segue simplesmente o exemplo de Cristo, referindo-se ao Criador como "Pai". Em outra ocasião - de acordo com o relato de Atos 17: 22-28 -, o apóstolo, dirigindo-se aos atenienses, mencionou um monumento que encontrara na cidade, um altar com a inscrição "A um Deus Desconhecido". Aproveitando o ensejo, tratou de chamar a atenção de sua assistência para o Deus, ao qual, sem saber, os cidadãos de Atenas prestavam devoção. Fez isso por "restaurar" o tetragrama ou mesmo por mencioná-lo? Não. O apóstolo referiu-se ao Criador como 'Deus', 'Senhor' e 'Ser Divino'. Pergunte-se o leitor: por que teria Paulo deixado passar tão preciosas oportunidades para "restaurar" o tetragrama ou, pelo menos, mencioná-lo, se esta fosse a verdadeira 'marca' do Cristianismo? Ao que tudo indica, nada havia a ser "restaurado" nos dias de Paulo nem tampouco em nossos dias.
Os Significados da Palavra 'Nome'
As Testemunhas de Jeová, de modo semelhante aos israelitas pactuados antes de Cristo, carregam como estandarte o nome 'Jeová'. Por assim procederem, presumem aplicarem-se a elas - e somente a elas - as palavras de Atos 15: 14, as quais falam sobre Deus escolher, entre as nações, "um povo para seu nome". É razoável tal raciocínio? Afinal, quantos sentidos existem para a palavra 'nome'? Podemos recorrer ao profeta Malaquias em busca de um importantíssimo significado para a palavra 'nome'. Observe o leitor o que diz o texto: "...disse Jeová dos exércitos a vós, sacerdotes, que desprezais o meu nome. E vós dissestes: 'De que modo desprezamos o teu nome?' Por apresentardes sobre o meu altar pão poluído.' - Malaquias 1: 6,7 Note o leitor que 'desprezar o nome' de Deus, aqui, nada tinha a ver com o uso do tetragrama, mas referia-se a violações da lei mosaica. Em outras palavras, quando se viola a lei de Deus se está desprezando seu 'nome' - quer dizer sua honra e glória -, sem que o uso de uma palavra específica como o tetragrama esteja envolvido. Também, em Eclesiastes 7: 1, lemos: "Um nome é melhor do que bom óleo, e o dia da morte é melhor do que o dia em que se nasce." Aqui, mais uma vez, vemos o termo 'nome' aplicado sem conexão alguma com o nome de batismo. Nesta passagem, 'nome' tem sentido de 'reputação', quer dizer, obter uma boa reputação é melhor do que obter uma coisa tão boa quanto um óleo refinado. Já Provérbios 10: 7 fala que "o nome dos iníquos apodrecerá". Neste caso, 'nome' significa 'lembrança' ou 'recordação'. Até mesmo em nossos dias, quando alguém diz: 'Pare em nome da lei!', obviamente não se refere a um nome específico, mas àquilo que a lei representa. Assim sendo, qual a validade de restringir o significado da palavra 'nome' em relação a Deus, conectando-o especificamente ao uso do tetragrama? Como assegurar que a expressão "um povo para seu nome" tem esse e apenas esse sentido? A própria Sociedade Torre de Vigia reconhece um sentido altamente abrangente variável da palavra 'nome'. O livro Ajuda ao Entendimento da Bíblia, p. 885 (em inglês) cita as palavras de um perito em hebraico: "Um estudo da palavra 'nome' no Velho Testamento revela o quanto essa palavra significa em hebraico. O nome não é um mero rótulo, mas é sugestivo da real personalidade a quem ele pertence." (Grifo acrescentado) Também o apóstolo João - referindo-se a Cristo - menciona a expressão "acreditar em seu nome" (João 1: 12), a qual significa acreditar na pessoa de Jesus. Este, por sua vez, ensinou seus discípulos a orar a Deus, dizendo, "santificado seja teu nome", sem no entanto mencionar o tetragrama. Preferiu o termo mais íntimo e carinhoso 'Pai'. Cremos que os exemplos acima são suficientes para mostrar a futilidade de insistir no reconhecimento dos verdadeiros cristãos à base da repetição compulsiva de uma palavra. Os 'frutos' morais e espirituais, estes sim, deveriam servir como aferidores da legitimidade da prática cristã. Do contrário, o cristão poderia facilmente tornar-se como aqueles a quem Jesus referia-se ao dizer: "Este povo honra-me com os lábios, mas o seu coração está muito longe de mim." - Mateus 15: 8 É possível traçar um certo paralelo entre as Testemunhas de Jeová e um outro movimento, também originário do Adventismo do século 19 - a Igreja Adventista do Sétimo dia. Ambas as instituições agarram-se tenazmente a um símbolo. No caso das Testemunhas, o tetragrama; no caso dos Adventistas, a guarda do sábado. Apenas o objeto de culto é distinto - a importância atribuída a ele é análoga. Em cada caso, serve como uma espécie de 'termômetro' ou 'sinal' do Cristianismo, o critério pelo qual ímpios e justos serão reconhecidos e julgados. Quando - no afã de reter seus membros - a Sociedade Torre de Vigia, apela para o uso do nome 'Jeová' como prova insofismável de ser a única religião verdadeira, ela aproxima-se perigosamente do seguinte argumento: "Não importa o que de errado fizemos, o que ensinamos ou o que quer que façamos - se carregamos o nome 'Jeová', apenas nós temos o favor de Deus." Acreditamos que o leitor está apto a discernir se este é o modelo ideal do verdadeiro Cristianismo.
Este artigo não se destina a dissuadir o leitor de referir-se a Deus por 'Jeová', 'Javé', 'Iavé' ou qualquer forma equivalente e inteligível em seu idioma - não objetamos a que assim o faça. Tampouco visa a depreciar o nome do Ser Magnífico - qualquer que seja o significado que 'nome' possa assumir. É nosso objetivo tão-somente que cada um sinta-se livre para exercer o Cristianismo sem amarras ideológicas alienígenas com respeito ao Evangelho - do modo como este chegou às nossas mãos. Cremos que a maioria das pessoas dificilmente trataria um pai querido de modo formal. Cristo não foi uma exceção, tendo se referido ao Criador dezenas de vezes por 'Pai'. Além disso, ensinou seus discípulos a fazerem o mesmo. Essa parece ser a mensagem cristalina das Escrituras Cristãs. O leitor é livre para seguir essa instrução sem motivos razoáveis para afligir-se em sua consciência. Poderá dirigir-se a seu Criador por 'Deus', 'Pai', 'Senhor', 'Yahweh' ou qualquer outra forma que esteja à altura de Sua glória. A compulsoriedade de dirigir-se ao Criador por um substituto híbrido de uma palavra fornecida a um povo pactuado, milênios antes do advento do Cristianismo - e cuja pronúncia está, irremediavelmente perdida -, certamente é um ensino estranho ao Evangelho. Como vimos, não há base arqueológica ou teológica seguras para ele. Nenhum povo na história da humanidade esteve tão vinculado a um nome e a regulamentos rígidos quanto o povo israelita. Superstições floresceram e os símbolos foram mais valorizados do que a realidade que eles representavam. Todavia, este arranjo prescreveu - e, junto com ele, seus rituais, regras restritivas e 'fetiches', incluindo-se o uso compulsivo e supersticioso do tetragrama. Os nomes podem variar, mas a realidade de um Deus único permanece! "Para tal liberdade é que Cristo nos libertou. Portanto, ficai firmes e não vos deixeis restringir novamente num jugo de escravidão." Gálatas 5: 1
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