|
MENSAGENS FINAIS |
O Tetragrama na Tradução do Novo Mundo
by List E-mail de HP Odracir
Informação ao leitor - as Testemunhas de Jeová têm usado, por décadas, a sua própria versão da Bíblia, chamada Tradução do Novo Mundo - um trabalho pouco prestigiado entre os peritos em línguas mortas. Uma particularidade desta obra é a inserção da palavra 'Jeová' (uma forma latinizada para o tetragrama, ou seja, o nome divino em hebraico) 237 vezes no Novo Testamento, no lugar do termo 'Senhor'. A despeito de tal procedimento entrar em choque com todas as evidências arqueológicas disponíveis (os manuscritos cristãos dos primeiros séculos), não sendo endossado pelos mais respeitados eruditos em traduções da Bíblia, ainda assim os autores da TNM alegam relevantes razões de ordem teológica. Muito embora esta pareça ser uma questão de menor importância para a maioria das religiões, trata-se de pilar doutrinal das Testemunhas, sobre o qual elas se apóiam para reivindicar o título de "restauradores" do nome de Deus - uma prerrogativa acima das demais denominações religiosas. Assim sendo, em razão de suas implicações, o assunto reveste-se do maior significado e certamente merece ser examinado em seus pormenores. O leitor verá agora a transcrição de trechos de um debate entre dois membros da lista "Testemunhas" sobre este fascinante tema. Boa leitura! Caro Odracir (...) Nesta mensagem, eu farei alguns comentários sobre o uso de “Jeová” no Novo Testamento e os critérios usados pela Comissão de Tradução da Tradução do Novo Mundo para a sua inserção. (...) Amigo R. Agradeço-lhe por sua contribuição no tema 'tetragrama no NT'. Já fiz acréscimos em meu artigo levando em conta alguns aspectos aqui colocados por você. Por isso, convido-o a examiná-lo novamente, em detalhes. Por alguns comentários seus, percebo que não releu meu artigo por inteiro. Quanto às suas últimas mensagens, comentarei algumas colocações que julgo relevantes na discussão deste tópico. Vamos lá.... Para começar, vamos revisar o critério adotado pela Comissão de Tradução da TNM (CTTNM) para a inserção de “Jeová” no Novo Testamento. Na Tradução do Novo Mundo – Com Referências (TNMRef), lemos o seguinte: “Para saber onde o nome divino fora substituído pelas palavras gregas Κύριος [Kýrios] e Θεός [Theós], verificamos onde os inspirados escritores cristãos citaram versículos, passagens e expressões das Escrituras Hebraicas, e depois voltamos ao texto hebraico para ver se o nome divino aparecia ali. Assim, determinamos a identidade a dar a Ký·ri·os e a The·ós, e a personalidade com que revesti-los. Para não ultrapassar os limites da exegese, fomos muito cautelosos na tradução do nome divino nas Escrituras Gregas Cristãs, sempre cuidadosos de tomar as Escrituras Hebraicas como fundo. Procuramos concordância das versões hebraicas para confirmar nossa tradução. Tal concordância das versões hebraicas foi encontrada em todos os 237 lugares onde o nome divino foi restabelecido nas Escrituras Gregas Cristãs.” A justificativa acima, apesar da aparente erudição, induz o leitor desinformado ao erro, pois sugere que, em nome do princípio da suposta "restauração" do tetragrama, o tradutor seguiu sistematicamente a metodologia de procurar o tetragrama nos textos hebraicos citados pelos cristãos e restabelecê-lo nas escrituras gregas, o que não é verdade. E nem poderia ser, pois tal regra, se generalizada, teria o efeito, não de esclarecer, mas de confundir mais ainda o sentido que o escritor original tinha em mente, ORA PARECENDO ENDOSSAR A NOÇÃO DE TRINDADE, ORA NEGANDO-A - a depender do texto em questão. Como esta aplicação sistemática não pode ser feita, fica claro que o critério - não confesso pelos autores da TNM - não é de fidelidade ao texto hebraico, mas de fidelidade à doutrina anti-trinitarista. Dificilmente um tradutor deixaria escapar que suas preferências teológicas é que estão guiando seu trabalho. A comissão da TNM não foi exceção. Além disso, está sobejamente demonstrado que os escritores cristãos faziam adaptações do AT, omitindo ou acrescentando palavras a ele em suas citações. Nenhum erudito em documentos bíblicos questiona isso e a própria Sociedade Torre de Vigia admite, embora com relutância, que é assim (um artigo dela fala de desvios ocasionais e omissões por parte dos escritores cristãos ao citarem o AT). Com efeito, as alterações eram, às vezes, tão profundas que davam margem a questionamentos sobre a validade da aplicação. Precisamente em razão disso foi que judeus radicais acusaram os cristãos de distorcerem as escrituras hebraicas para adaptá-las ao seu movimento. Áquila, Teodósio e Símaco produziram traduções gregas bem literais do AT, justamente para 'sanar' aquilo que consideravam 'deturpações cristãs' das escrituras hebraicas, especialmente nos livros proféticos (Isaías, Jeremias etc.). Um exemplo notável encontra-se em Mateus 27: 9, onde o autor refere-se a Jeremias citando uma passagem que, na verdade, não se encontra no livro de Jeremias, mas corresponde a uma versão bastante alterada do trecho de Zacarias 11: 12-13. Alguns sugerem que Mateus errou, outros dizem que ele mencionou Jeremias pelo fato de este ser um dos profetas "maiores" (explicação pouco consistente). Esta e outras passagens de Mateus geraram ressentimento nos judeus conservadores. A polêmica nunca foi devidamente esclarecida. Uma nota de rodapé na Bíblia de Jerusalém esclarece que o autor referiu-se a Jeremias meramente por aproximação, visto que este profeta falou algumas vezes em "campos de oleiro", embora em outro contexto. Em todo caso, se lermos o livro de Zacarias, jamais encontraremos as palavras da forma que Mateus as representou - deveras, elas parecem um tanto 'forçadas'. Compare as passagens e verá que, em face da significativa diferença entre elas, somos obrigados a concluir que, de fato, os autores cristãos, a exemplo de Mateus, usavam de liberdade - às vezes, muita liberdade com o texto hebraico original. Outros exemplos poderiam ser citados, mas este ilustra de forma contundente o ponto em questão. Este fato, por si, torna a metodologia adotada pela comissão da TNM um procedimento excessivamente temerário e tendencioso, pois, mesmo que haja uma referência a um texto do AT que continha o tetragrama, NÃO SE PODE GARANTIR QUE O ESCRITOR CRISTÃO O REPRODUZIU EM SUA CITAÇÃO. Afirmar - como faz a comissão da TNM - que eles estavam "obrigados" a isto a isso é negar toda a evidência documental e fechar os olhos ao momento histórico em que nasceu o cristianismo. Desta forma, cai por terra a tese da Sociedade Torre de Vigia de "voltar ao texto hebraico para ver se o nome divino aparecia ali". Fazer isso é tentar reescrever o Novo Testamento. Ao que me consta, tal prerrogativa não cabe ao Corpo Governante nem a qualquer outro grupo de homens da atualidade. O procedimento imparcial é CURVAR-SE AOS DOCUMENTOS MAIS ANTIGOS E COMPLETOS do NT (que não incluem o tetragrama), e não tentar "reformá-los". Se o tetragrama estava nos escritos cristãos, NÃO É CORRETO RETIRÁ-LO, MAS SE NÃO ESTAVA, NÃO É CORRETO INSERI-LO. Onde procuraremos a resposta? Em especulações não comprovadas? Em preferências teológicas? Não. Devemos nos reportar às evidências históricas e arqueológicas. O que elas nos dizem ? Ora, das cerca de 5 mil cópias existentes do NT, NENHUMA APRESENTA O TETRAGRAMA, QUER NO HEBRAICO ORIGINAL QUER TRADUZIDO PARA OUTRA LÍNGUA. Este fato puro e simples é reconhecido pela própria Torre de Vigia. Por outro lado, se as cerca de 7000 vezes em que o tetragrama, de fato, aparece nas escrituras hebraicas originais devem ser considerados como razão para reproduzi-lo no AT, creio que as mais de 5000 cópias existentes do NT, pelo mesmo princípio, devem ser consideradas como razão para NÃO inseri-lo nas citações dos cristãos. Todavia, não foi isso que a comissão da TNM fez. Ela arvorou-se em 'juíza' dos copistas das escrituras cristãs, apoiou-se em sua própria teologia e forçou os textos a endossarem-na, de modo que não foram as escrituras que guiaram a crença, mas a crença que guiou as escrituras, da forma como foram vertidas na TNM. Finalizando, a última declaração da TNM, de que a concordância com as traduções hebraicas foi obtida em todas as 237 inserções, novamente, induz o leitor desavisado a um erro de juízo, pois tais traduções NÃO TÊM AUTORIDADE para modificar os originais gregos que lhes serviram de base, sendo eles mais de mil anos mais antigos e não contendo, em qualquer trecho, o tetragrama. Os autores da TNM citam tais traduções como se elas fossem tão dignas de crédito quanto os manuscritos Alexandrino, Vaticano, Sinaítico (3o. ao 5o. século) e outros - isto não está nem perto de ser verdade. A mais antiga tradução hebraica data do século 14 e a mais recente data de cerca de 3 décadas atrás. Estranhamente, as notas da TNM omitem também o fato de que as traduções hebraicas (J), com exceção da de Shem-Tob, são alterações grosseiras do NT, criadas com o intuito de converter judeus ao cristianismo, endossando a trindade. Parece-me clara desonestidade intelectual omitir tais fatos relevantes do leitor e, ainda por cima, procurar apoio em tais traduções para inserir 'Jeová' 237 vezes nos escritos cristãos, contrariando o próprio propósito para o qual tais obras foram produzidas. Além disso, a alegada "concordância" foi totalmente SELETIVA e não uniforme. Primeiro, porque os autores das tais traduções inseriram este nome de forma generalizada, incluindo-o em trechos que os autores da TNM jamais ousariam alterar (por exemplo, em certas passagens, chama-se claramente Jesus Cristo de Jeová, contrariando a crença das Testemunhas). Segundo, por que os autores da TNM "escolheram" quais versões e quais trechos delas deveriam servir de apoio - isso se chama, em linguajar técnico, supressão de evidência contrária, uma técnica nada ortodoxa nem erudita. Nem assim se conseguiu concordância com TODAS as traduções em TODOS os trechos que inseriram 'Jeová'. Uma consulta às notas de rodapé mostra claramente isso - em cada passagem, algumas traduções apóiam a inserção e outras, não. Agora, pergunto: deveria a comissão da TNM estar ocupada garimpando palavras em tais documentos tendenciosos ou melhor faria em se curvar ao simples fato de que, até esta data, nunca se achou uma única ponta de evidência do tetragrama no NT? A resposta me parece óbvia... Resumindo: ao deparar-se com uma referência ao AT feita por um escritor cristão, os tradutores voltavam ao AT e verificavam se o Tetragrama ocorria ali naquela passagem. Em caso positivo, o nome “Jeová” era inserido no texto do NT em questão. Porém, como você observou, Odracir, e como todos nós sabemos muito bem, os tradutores da TNM inseriram “Jeová” em vários outros textos onde não se faz referência a textos do AT que contêm o Tetragrama. Assim, parece que este critério citado acima não foi o único critério usado pelos tradutores para determinar quando inserir o nome “Jeová”. Eu não diria "parece" - está mais do que claro que realmente não foi. No entanto é isto o que dá a entender a explicação no apêndice da TNM. O leitor menos informado se satisfaz com a explicação e nem percebe que ela apresenta colossais 'furos'. De modo que podemos dizer que a comissão tradutora da TNM falhou em comunicar claramente aos leitores o fato de que nem todos os usos do nome divino “Jeová” no NT foram baseados em ‘citações de versículos, passagens e expressões das Escrituras Hebraicas’. Quanto a isso, uma crítica é justificada. Certamente que é. Neste caso, é legítimo perguntar: POR QUE a comissão, tão "detalhista" em outras coisas, fez "vista grossa" a estes aspectos? Poderia ter algo a ver com o fato de que, se fornecesse tal justificativa, ficaria claro o tendencioso critério dos tradutores, a saber, usar - e de forma seletiva - evidência de origem questionável. No mesmo apêndice citado anteriormente, algumas linhas antes, os editores da TNM c/ ref. mencionam traduções hebraicas do AT, representadas por um “J” com um número sobrescrito, que também usaram o nome divino no NT. Eles escreveram que tais traduções “restabeleceram o nome divino não só quando se tratava de citações das Escrituras Hebraicas, mas também em outros lugares em que os textos exigiam tal restabelecimento.” Embora a comissão tradutora daTNM não tenha dito isso claramente em lugar algum, é evidente que eles adotaram o mesmo procedimento destas traduções: quando um determinado texto do NT (que não faz citação do AT) fala do “Senhor” e o contexto deste texto refere-se a Jeová Deus, “Jeová” é inserido. Equívoco. Não foi especificamente esta a filosofia de trabalho de vários autores daquelas traduções - eles inseriram o tetragrama tanto nas passagens em que se referiam a Deus como naquelas que se dirigiam a Cristo por "Senhor', já que, para eles, estes são a mesma pessoa. Como já falei, estas obras destinavam-se principalmente a judeus e quanto mais contivessem referências ao tetragrama, maior seria a aceitação das traduções pelo público-alvo e mais fácil seria convertê-lo ao cristianismo. Na mesma nota, a comissão omite, de forma suspeita, outro aspecto fundamental do processo - quais são as passagens "restabelecidas" e qual o critério utilizado para se concluir que os "textos exigiram tal restabelecimento"? Obviamente, a comissão não poderia revelar em sua inteireza os objetivos dos autores daquelas obras, pois ficaria evidente que estes eram contrários aos das Testemunhas de Jeová. Resumindo: a) Objetivo das traduções hebraicas (exceção da de Shem-Tob, a qual não usa o tetragrama, apenas a expressão "O Nome") - "restaurar" o tetragrama no máximo de passagens em que isto fosse possível, independentemente de a referência ser a Deus ou Cristo. Isto as tornaria mais 'palatáveis' para os prosélitos judeus. b) Objetivo da comissão da TNM: "restaurar" o tetragrama APENAS NAS PASSAGENS EM QUE TAL "RESTAURAÇÃO" NÃO ENDOSSASSE A TRINDADE. Agora entendemos o porquê de as notas da TNM serem tão reticentes quanto à natureza de tais obras hebraicas. Se confessada a prática, pareceria um contra-senso lançar mão destas traduções trinitaristas tardias. Outra desonestidade intelectual - os tradutores adotaram o procedimento de tais autores APENAS QUANDO SE ENCAIXAVA EM SUAS DOUTRINAS, REJEITANDO-O QUANDO ELE AS CONTRARIAVA. Diferentemente dos criadores destas traduções hebraicas, os autores da TNM sentiam-se incomodados quando a inserção de Jeová identificava claramente Jesus Cristo com o Todo-Poderoso, MESMO QUE A CITAÇÃO EM QUESTÃO FOSSE ORIGINÁRIA DO ANTIGO TESTAMENTO HEBRAICO. Nestas passagens, subitamente, as tais traduções não mais eram dignas de crédito, mas naquelas onde pareciam apoiar as idéias das Testemunhas de Jeová, agora sim, elas eram evocadas como fonte bibliográfica confiável. Chamaria isso de procedimento academicamente isento? Ou expressam o puro preconceito? Eles deveriam ter esclarecido isso em seu apêndice também. Nestes textos, eles usaram o seu próprio julgamento: em textos cujo contexto indica que o kýrios (“Senhor”) referido é Jeová Deus, eles o substituíram pelo nome divino, e em textos cujo contexto não indica isso, a substituição não foi feita. É verdade. Todavia, fica, claro que tal julgamento estava irremediavelmente comprometido pela idéia prévia de que os autores bíblicos jamais poderiam estar identificando Deus com Cristo - isto se chama preconceito negativo. Os trinitaristas, por sua vez, manifestam preconceito positivo. Agora, pergunto: o que deveria prevalecer - o 'JULGAMENTO' (ou preconceito) DA COMISSÃO DA TNM OU O PESO DAS MAIS DE 5 MIL CÓPIAS DO NT? Com que autoridade os autores da TNM podiam contestar as evidências arqueológicas? Se eles podem desprezá-las quando conveniente, recorrendo a fontes duvidosas em busca de apoio, então quaisquer outros tradutores poderão fazer o mesmo. Por exemplo, a atitude do ex-Padre Johannes Greber, ao fazer uma tradução - segundo as palavras dele próprio - "bem espírita" do NT, deveria, sob esta ótica, ser considerada tão legítima quanto aquela adotada pela Sociedade Torre de Vigia. Seria legítimo que ele recorresse até aos trabalhos de Alain Kardec para apoiar sua forma de traduzir certos textos. Se o 'julgamento' de uns é válido, também o é o de outros... Este procedimento é normal para os tradutores, porque eles não podem seguir regras rígidas que se apliquem a cada situação; antes, devem levar vários fatores em consideração e, então, tomar a sua decisão. Naturalmente, por ser este um critério subjetivo, onde a inserção de “Jeová” foi guiada pelo seu próprio julgamento, ele está aberto a críticas e questionamentos. É exatamente por isso que eu insisto que o tradutor mais adequado é aquele que NÃO SE SENTE IDEOLOGICAMENTE INCOMODADO POR ESTA OU AQUELA FORMA DE VERTER UM TRECHO. O que foge a isto torna-se tendencioso. Se um texto grego traz a palavra kyrios, não há outra forma de traduzi-la que não seja por 'Senhor', não importa se a referência é a Deus ou a Cristo (é o que faz uma tradução de 1985, por acaso publicada pela própria Sociedade). Agir de outra forma implica admitir ou que o escritor cristão expressou-se mal ou que os textos originais foram adulterados. A primeira hipótese atinge em cheio a inspiração divina e a segunda não tem respaldo histórico ou arqueológico. Eu, particularmente, concordo com o julgamento do contexto de vários textos feito pela TNM; há muitos lugares onde também acho que o contexto refere-se claramente a Jeová Deus. Se você se refere ao NT, permita-me discordar totalmente. Pelos motivos já vistos, em parte nenhuma das escrituras cristãs está a comissão tradutora da TNM - ou qualquer outra comissão - autorizada a inserir no texto grego palavras que, de acordo com toda a evidência documental disponível, lá não se encontram. Agir desta forma é assassinar os princípios elementares da arqueologia. Por outro lado, discordo do seu julgamento concernente a vários outros textos. Há vários textos cujo contexto é ambíguo e não está claro se o “Senhor” em questão se refere a Jeová ou a Jesus, e em tais textos a inserção de “Jeová” não é garantida e pode ser justificadamente questionada e criticada (Por exemplo, Romanos 14:6-9 e Colossenses 4:22-24). Em nenhum destes textos ou em quaisquer outros do NT pode-se inserir 'Jeová' contra todas as evidências materiais e ainda assim dizer que tal ação é academicamente honesta. A autoridade NÃO é o contexto, mas o texto grego das 5 mil cópias antigas hoje existentes. Por que não deixarmos que elas falem por si próprias? Se a palavra encontrada no texto é kyrios, simplesmente traduz-se 'Senhor', sem mais considerações. A própria Tradução Interlinear do Reino, na qual afirma--se que a TNM se apóia, faz exatamente isso, na quase totalidade das 714 vezes em que a palavra ocorre no NT (veja a comparação em meu artigo). Foi também o que fez a esmagadora maioria dos tradutores, aqueles que a comissão tradutora da TNM rotulou de "indignos". Curiosamente, a comissão da Torre de Vigia preferiu, arrogantemente, ir na contra-mão da maioria. Quem agiu com mais coerência e dentro do critério científico? Deve ser dito também que, ao contrário do que muitos pensam, a TNM não se colocou sob a obrigação de colocar “Jeová” onde quer que as traduções hebraicas do NT (traduções “J”) o usassem; em parte alguma eles afirmaram tal suposto critério. Antes, eles declararam claramente no apêndice da TNM c/ ref: “Procuramos concordância das versões hebraicas para confirmar nossa tradução.” Portanto, eles não afirmaram que seguiriam as traduções hebraicas onde quer que elas usassem o nome divino. Eles recorreram a estas traduções apenas para procurar “concordância” para “confirmar” a tradução deles. Os tradutores das traduções “J” basearam-se no seu julgamento quanto a onde inserir “Jeová”, e os tradutores da TNM basearam-se no deles; adicionalmente, eles também levaram em consideração o contexto. Ora, amigo R., é óbvio que a comissão da TNM não poderia seguir cegamente o rastro destas traduções, simplesmente pelo fato de elas serem, em geral, trinitaristas e generalizarem o uso do termo 'Jeová', confundindo e não distinguindo Deus e Cristo. Como já disse, os autores da TNM só as seguiram onde foi conveniente. O objetivo da Torre de Vigia com sua tradução era duplo: a) demonstrar que os cristãos usavam o tetragrama, o que supostamente colocaria as Testemunhas de Jeová em posição privilegiada em relação às outras religiões b) demonstrar que Deus e Cristo não são parte de uma trindade O primeiro objetivo é totalmente órfão de evidência histórica ou arqueológica (veja o assunto em meu artigo) e o segundo, é uma questão polêmica que jamais foi sanada em quase 2 milênios de cristianismo. Nesse ponto, vale salientar que a ortodoxia teológica colocou-se do lado da trindade. Os autores da TNM tratam esta questão como se ela estivesse resolvida e nada pode estar mais longe da verdade do que esta afirmação. No afã de negar tal doutrina, os tradutores da TNM foram muito mais longe do que apenas alterar o NT - eles também alteraram o AT. Em Gênesis 1: 2, por exemplo, eles verteram a palavra hebraica ruah [vento ou sopro, sem artigo definido] por " a força ativa de Deus". Isto é uma forma inaceitável de paráfrase, pois o tradutor, além de presumir que o termo em questão referia-se ao Espírito Santo (os autores, por ex., da Bíblia de Jerusalém discordam) ainda substituiu as palavras do escritor pela sua própria definição de 'espírito santo', ou seja, uma 'força ativa'. O que pensa um publicador leigo ao abrir tal passagem diante de um morador para provar que o Espírito Santo não é uma pessoa? Em sua ignorância, só pode pensar que isto está escrito assim mesmo no texto hebraico de Gênesis. Quão fútil é a tentativa, em nome de uma doutrina, de fazer os textos dizerem o que não dizem! Os peritos evangélicos consideram que o texto bíblico, nesta e noutras passagens - incluindo-se aquelas 237 da TNM - foi impiedosamente violentado por uma ideologia. Neste caso, eu me inclino a concordar com eles. Eu, particularmente, sou a favor de que, onde haja citações formais de textos do AT que contenham o Tetragrama, “Jeová” seja usado. Esta é a teoria da qual a Sociedade Torre de Vigia se serve para se colocar acima de todos os outros movimentos religiosos. Se esta é também sua posição pessoal, certamente não se baseia na evidência palpável dos mais de 5 mil manuscritos do NT hoje disponíveis. Se não se baseia neles, então trata-se - como você próprio reconhece - de pura especulação, suposição, preferência pessoal, nada mais. Além disso, lembre-se que a palavra 'Jeová' é, em si mesma, um circunlóquio ou substitutivo, pois combina sons consonantais de uma palavra desconhecida com os sons vocálicos da palavra 'Senhor'. Trata-se de uma leitura equivocada do termo grafado pelos massoretas com a finalidade, não de induzir à pronúncia do nome original (o qual já estava perdido), mas simplesmente de padronizar a grafia. Conforme a obra do erudito Dr. Paul Kahle, os leitores, ao se depararem com esta palavra híbrida, ignoravam as consoantes e simplesmente diziam 'Senhor'. Não poderiam fazer de outro modo, já que, por séculos o nome não era pronunciado e o hebraico havia caído em desuso entre os judeus, sendo o grego a língua mundial da época. Se é válida tal mistura de letras, a qual não passa de uma tradição católica do século 13, e que não corresponde ao nome original, então é natural perguntar, como fazem os evangélicos - por que não se podem usar, com a mesma legitimidade, termos como 'Pai', 'Senhor' etc.? As minhas razões são as seguintes: creio que os manuscritos originais do NT continham o nome de Deus. O amigo, não sei se voluntária ou involuntariamente, está a reproduzir uma teoria bastante enfatizada pela Sociedade Torre de Vigia, exposta por um professor da universidade da Geórgia, USA - George Howard - na década de 70. Eu mesmo li o artigo dele e posso dizer com convicção que o professor JAMAIS afirmou categoricamente que o tetragrama hebraico estivesse presente nos escritos cristãos - ele apresentou isto apenas como uma simples hipótese, apoiada em evidência indireta, a saber, o fato de existirem algumas cópias da LXX nos tempos de Cristo que continham o tetragrama. Contudo, a evidência arqueológica revela que os escritores cristãos não pretendiam criar um cristianismo para os judeus e outro para os gentios. Dirigindo-se a leitores de língua grega, citavam versões da LXX que não continham o tetragrama - não poderiam fazer de outra forma, já que o nome jamais foi traduzido pelos judeus para qualquer língua e os gentios não conheciam caracteres hebraicos. Assim, afirmar o contrário sem provas diretas dificilmente seria uma atitude própria a um perito responsável. Por isso, em todo o seu artigo, o prof. Howard emprega expressões de extrema cautela, tais como "podemos imaginar", "se esta teoria for correta", "é razoável crer" etc. A matéria tem roupagem científica e, como tal, NÃO FAZ AFIRMAÇÕES, SÓ PERGUNTAS. Não poderia ser diferente, pois este perito está ciente do fato de que não existe UMA ÚNICA cópia antiga do NT que siga esta prática. Insistir na imposição categórica desta teoria, como faz a comissão da TNM, é lançar mão de retórica vazia. A propósito, em correspondência a um leitor (publicada em meu artigo), o eminente pesquisador reconhece que sua teoria fica mais enfraquecida ainda pelo fato de uma cópia antiga dos escritos de Paulo (os papiros Chester Beatty) não apresentar o tetragrama em parte alguma. Além disso, na mesma carta, ele afirma que NÃO APÓIA A TESE DAS TESTEMUNHAS DE JEOVÁ. Assim sendo, amigo R., recomendo-lhe a mesma cautela daquele intelectual. Ao mencionar a existência do tetragrama no NT, deixe sempre claro que se trata de mera opinião pessoal, especulação, suposição, nada mais. Um último detalhe: o artigo do prof. Howard fala sobre a inclusão do tetragrama EM HEBRAICO no texto grego. Em parte nenhuma ele apóia a inclusão de 'Jeová' ou qualquer outro substitutivo. (...) todos os escritores do NT eram judeus cristãos devotos e justos; creio que quando citavam um texto do AT que continha o Nome, eles não o omitiam/removiam/substituíam, mas o preservavam em suas citações, devido ao respeito e a reverência que tinham por Deus e pelo seu nome. Aqui, o amigo, aparentemente, cometeu um equívoco - os judeus não omitiam/removiam/substituíam o tetragrama por falta de zelo pelo nome divino. Muito pelo contrário, faziam isso pelo excesso de zelo. Deveras, foram exatamente o respeito e o temor por Deus que os induziram a não pronunciar o nome, preferindo as expressões "Deus" ou "Senhor", cujo uso se generalizou muito antes de Cristo nascer. Infelizmente, esta prática selou para sempre a pronúncia original, pois o hebraico arcaico não tem vogais e o tetragrama JAMAIS foi traduzido para o grego ou qualquer outra língua, privando assim outros povos de saberem como os antigos patriarcas o utilizavam. Foi este ambiente que Jesus e os apóstolos encontraram em seu tempo. E a julgar pela freqüência com que a própria TNM atribui o uso do tetragrama por eles (veja o gráfico em meu artigo), só podemos concluir que esta questão não era vital para os cristãos. Além disso, o termo "judeu cristão", empregado por você, guarda uma contradição em si mesmo, já que aqueles que poderiam se enquadrar nesta definição - os Ebionitas - defendiam preceitos da lei mosaica que os cristãos haviam abolido. Como resultado, surgiu a contenda em Jerusalém sobre os cristãos estarem ou não obrigados a seguir as leis de Moisés, suscitando o primeiro concílio apostólico de Atos, cap. 15. Note que a decisão dos apóstolos nada fala sobre a necessidade de empregar o tetragrama. É historicamente certo que havia o costume de pronunciar "Senhor" ou "Deus". Todavia, nem neste momento nem no sermão do monte, houve qualquer condenação a esta prática. Quem cala, consente... ...assim como Jesus, eles não seguiam as regras, costumes e superstições dos outros judeus, tais como os fariseus, saduceus e essênios; creio que, assim como Jesus, eles ‘tornavam manifesto o nome de Deus’ e ‘davam-no a conhecer’. (João 17:6, 26) Por estes motivos, creio ser razoável crer que os escritores cristãos do NT não evitariam o uso do nome divino... Aqui, o amigo faz uma curiosa distinção entre os judeus - um grupo de judeus "cristãos" que não seguiam regras e os "outros judeus", que se apegavam a regras. Ora, como seria possível ser um judeu sincero e não se apegar a regras, quando a essência do Pentateuco são os ritos, costumes e regras? Superstições são herança cultural e somam-se aos costumes de qualquer povo. Os cristãos não estavam isentos disso. Por outro lado, tanto fariseus quanto saduceus, essênios e zelotes apegavam-se de perto aos escritos de Moisés e às tradições judaicas. As diferenças entre eles estava mais ligada à forma com que exerciam sua fé - os fariseus se consideravam "doutores da lei", os saduceus eram mais pragmáticos, não crendo em ressurreição, os essênios esperavam o fim do mundo isolados da sociedade e os zelotes eram combatentes políticos. Mas todos eram judeus na essência, com seus costumes e rituais. Quem quebrou isso foi Cristo, tendo encontrado forte resistência dos sacerdotes. Se fosse possível ser uma mistura de judeu e cristão, como você sugere, não haveria motivo para uma contenda entre os dois movimentos. O fato é que o cristianismo representou uma ruptura com o passado - sua mensagem era universalista, diferente do tribalismo judaico. Por esta razão, era naturalmente difícil para um judeu sincero aderir a ele. Portanto, ao se tornar cristão, que regras um judeu abandonaria e a quais se apegaria? Não há resposta simples a esta pergunta. O concílio apostólico mostrou que os ritos ligados ao templo e às impurezas estavam abolidos aos cristãos. Quanto ao resto, pode-se conjeturar, não afirmar categoricamente. O silêncio das escrituras quanto ao costume judaico de referir-se a Deus por 'Senhor' deixa a questão aberta. No tocante à questão de "dar a conhecer um nome", não necessariamente isso envolve a pronúncia de uma palavra, mas tem sentido muito mais amplo (discuto este assunto em meu artigo). Alguém pode dizer, por exemplo, "em nome da lei" e isto não se refere a uma palavra, mas ao significado da lei, tudo o que ela envolve. Outra pessoa pode dizer, "em nome do rei" - isto não se refere a um nome de batismo, mas diz respeito à reputação de alguém. A própria Bíblia atribui vários sentidos à palavra 'nome'. Os apóstolos empregavam expressões como 'acreditar no nome de Cristo' (João 1: 12) e isto não significava nome de batismo mas a aceitação da pessoa de Jesus. Restringir o ato de dar a conhecer o nome de Deus à busca da pronúncia de um nome perdido na neblina do passado - pelo próprio hermetismo da cultura judaica - é uma coisa que interessa à Sociedade Torre de Vigia, pois ela faz uso político deste ensino, promovendo-se como o único povo 'para o nome de Deus'. Enquanto isto, os trinitaristas pouco se preocupam com esta questão, pois, para eles o YHVH do AT é o mesmo Cristo do NT. Não é difícil deduzir que toda esta polêmica está muito mais ligada à velha rixa 'Unitarismo x Trinitarismo' do que a qualquer outro aspecto. Agora, nos lugares onde não se trata de citação formal de textos do AT que contêm o Nome, eu acho que o tradutor deve manter o “Senhor”; ele poderia informar ao leitor numa nota de rodapé qual poderia ser a identidade deste “Senhor” de acordo com o contexto da passagem, Jeová Deus ou Jesus Cristo... A questão é - como saber se a citação é formal ou informal? Em Romanos 10: 13, Paulo cita Joel 2: 32, um texto bastante curto. Pode-se garantir, à base da correspondência de algumas palavras-chaves, que TODO o texto está sendo reproduzido ao 'pé da letra', tal qual se acha nas escrituras hebraicas? Ora, a LXX transcreve esta mesma passagem de Joel com 'Senhor', não com o tetragrama. Teria Paulo, que prestigiou a LXX em diversas passagens, a rejeitado nesta citação? Como falo em meu artigo, os versículos à volta falam claramente de Cristo. Então, que garantia há de que Paulo inseriu o tetragrama? Não poderia ser - como se verifica em diversas outras passagens - uma adaptação (ainda mais quando há diversas passagens falando em "invocar o nome de Jesus")? Uma citação informal pode diferir em APENAS UM TERMO da original, dando a falsa impressão de que poderia ter sido formal no princípio, tendo sido adulterada. Os autores da TNM parecem se achar capazes de distinguir perfeitamente uma citação livre de uma literal. No entanto, toda esta discussão é fútil, simplesmente por que não tem alicerce documental arqueológico no qual se apoiar. Portanto, não vejo porque prosseguir com ela. Bom, mas esta é apenas a minha sugestão. Se os tradutores querem colocar o nome divino em outros lugares além das citações, esta é uma prerrogativa deles. Foi o que os tradutores da TNM fizeram. Acrescentar palavras ao NT, a quais, segundo TODAS as evidências materiais, NÃO estavam lá, certamente NÃO é prerrogativa legítima dos tradutores da TNM como não é de quaisquer outros tradutores. Bem como os tradutores das traduções hebraicas do NT e os de outras versões. Todos eles tiveram os seus motivos. Se há motivos TEOLÓGICOS, estes devem ser claramente explicitados no prefácio ou em notas de rodapé e não disfarçados sob a forma de explicações rebuscadas e ambíguas, rodeios, meias-verdades e omissões de evidência contrária. Isto possibilitaria ao leitor encarar esta ou aquela passagem com a necessária reserva. Do meu ponto de vista, a tradução deve ser preponderantemente ACADÊMICA. Caso uma passagem seja controversa, o tradutor, ao optar pela palavra que lhe parece mais apropriada gramaticalmente, deve informar o leitor que a referida passagem é vertida de diferentes formas, de acordo com diferentes entendimentos e teorias, e que as regras gramaticais não são, em si mesmas conclusivas, não sendo, pois, conveniente fechar questão em torno daquele trecho em particular. Isto é o que manda a prudência e o bom senso. O que foge a isso é sectarismo e não erudição. Paixão e lucidez não combinam. Como você afirmou em sua mensagem anterior, o dos tradutores das traduções hebraicas do NT foi o de identificar Jesus e Jeová como a mesma pessoa; o dos tradutores da TNM foi honrar a Jeová, conforme eles declaram na introdução de sua tradução. Equívoco. Os objetivos deles foram, como já falei, 1) distinguir Deus e Jesus Cristo, negando a trindade e 2) fazer crer que os cristãos usavam o tetragrama. O primeiro objetivo tem caráter doutrinal, ideológico, e o segundo, caráter político (conferir às Testemunhas o invejável título de "restauradores" do nome de Deus). Apelar para o 'louvor a Jeová' como justificativa para criar a TNM, tem dois propósitos - 1) Disfarçar os objetivos reais e 2) Dar uma motivação 'nobre' e, aparentemente, isenta para as grosseiras alterações do texto original. Até que ponto os autores da TNM estavam plenamente conscientes da desonestidade deste processo, é uma questão a discutir. Seres humanos podem cometer até atrocidades julgando que agem bem. Todavia, o uso que as Testemunhas têm feito da tradução de casa em casa demonstra bem que os objetivos acima foram muito bem atendidos. Cada um com os seus motivos e suas idiossincrasias. Eu só não acho justo que estes críticos, eruditos, apologistas e comentaristas critiquem somente os da TNM. Aqui, precisamos distinguir duas coisas: 1) a tendenciosidade de grupos religiosos trinitaristas que atacam ferozmente os autores da TNM, muitas vezes incorrendo nas mesmas práticas e 2) os métodos escusos adotados pela Sociedade Torre de Vigia ao tentar reescrever o NT com o fim precípuo de autopromoção. Estas duas coisas são igualmente condenáveis e uma não justifica ou ameniza a outra. Mais injusto ainda é que o público leigo fique à mercê das "idiossincrasias" de grupos religiosos fundamentalistas, sejam quais forem eles. Sinceramente, creio que mesmo que houvesse vários manuscritos do NT que contivessem o nome de Deus, ainda assim os tradutores não o usariam nas suas traduções. Tal evidência não bastaria para motivá-los a usar o nome divino. O texto do AT contém o nome de Deus 6.973 vezes, há muitos manuscritos hebraicos que comprovam isso, e, mesmo com tudo isso, os tradutores se refreiam de usá-lo, o omitem/removem e o substituem por “Senhor”! Certamente, tais tradutores não teriam nenhum escrúpulo em fazer o mesmo caso o nome de Deus ocorresse no texto do NT. A situação chega a ser interessante: de um lado há as traduções cujos tradutores removeram o Nome 6.973 vezes, mesmo havendo vários manuscritos disponíveis sustentando o seu uso; do outro lado, há a TNM, cujos tradutores colocaram o Nome 237 vezes, mesmo não havendo nenhum manuscrito sustentando o seu uso (tendo eles usado as citações do AT que contêm o Nome e o contexto de outras passagens como meios de determinar a sua inserção). Sobre os primeiros (–6.973), ninguém fala nada; nenhuma crítica. Sobre os últimos, todo mundo censura e execra impiedosamente! Que incoerência! –6.973 vs. +237. Sinceramente, se os tradutores da TNM podem ser culpados e condenados pelo acréscimo do Nome (+237), os tradutores dessas outras traduções podem ser culpados e condenados pela omissão, pela remoção, pela subtração (–6.973), do Nome, e muito mais abundantemente. Creio que o erro deles é maior, mais grave e mais reprovável do que o dos tradutores da TNM. Afinal, eles, no erro deles, deixaram de dar honra e glória a Jeová; Jeová Deus foi privado disso; já os da TNM, no erro deles, deram honra e glória a Jeová. Sabe, vendo tal coisa e fazendo uma comparação . . . eu . . . eu meio que acabo concordando com os tradutores da TNM. Erro por erro, eu ficaria do lado da TNM, se tivesse de escolher. É inegável que a Sociedade desonra a Jeová pelos erros e arbitrariedades que cometeu/comete, tais como na questão do sangue, transplantes, falsas profecias, etc., mas pelo menos neste ponto aqui ela fez algo positivo. Creio que está havendo um mal-entendido. Os autores de várias traduções da Bíblia deixaram de incluir uma representação do tetragrama por razões lingüísticas, antes que por razões doutrinais. O nome divino é o único nas escrituras cuja pronúncia exata se perdeu totalmente. A única coisa que resta dele são 4 letras hebraicas e uma enorme celeuma sobre sua pronúncia. Como os judeus que preparavam cópias da LXX para outros judeus não o traduziam para o grego, mas o mantinham na forma original, para seguir estritamente o exemplo deles, deveríamos representar hoje as mesmas 4 letras hebraicas. Agora, pergunto: quem compreenderia o texto? Deste modo, as traduções que empregam o vocábulo 'Senhor' simplesmente seguem o padrão da esmagadora maioria das versões da LXX hoje disponíveis, padrão este plenamente endossado pelos autores do NT. Além disso, elas normalmente apresentam o termo em maiúsculo e explicam em notas de rodapé que a expressão "SENHOR" está ali no lugar de uma palavra hebraica de grafia incerta. A Bíblia de Jerusalém me parece bem versátil em sua forma de lidar com o assunto - em todo o AT aplica o termo Iahweh (uma forma provável do tetragrama, embora não a única) e no NT, os termos "Senhor" e "Deus", em pleno acordo com os manuscritos gregos dos primeiros séculos. Isto faz desta versão uma das mais prestigiadas que há. Contudo, afirmar que um tradutor que coloca uma expressão híbrida como 'Jeová' é mais 'digno' do que um que verte a palavra por 'Senhor' é confundir questões acadêmicas com questões doutrinais. Primeiro, porque a palavra 'Jeová' não é mais adequada ou precisa do que a palavra 'Senhor'. Esta última representa o termo amplamente encontrado na esmagadora maioria dos manuscritos antigos de língua grega, sendo facilmente traduzível para qualquer língua. Já o termo 'Jeová' é um amálgama de palavras (YHVH + 'Senhor', em hebraico), sem sentido gramatical algum e estranho aos escritores cristãos. Entre aplicar o termo tradicional 'Senhor' (curiosamente, a própria Torre de Vigia apela para a tradição do termo 'Jeová'), facilmente compreensível em qualquer idioma e inserir uma palavra híbrida que substitui outra de grafia e pronúncia incertas, é plenamente compreensível que muitos autores tenham preferido a primeira opção. Por esta razão - e não em desafio às quase 7000 vezes em que a palavra original ocorre no AT - é que muitos autores aplicam o termo 'Senhor'. Achar hoje este termo ou algum outro substitutivo em uma versão é mera questão de autor. Caso houvesse um consenso entre os autores sobre a forma correta de representar o tetragrama e se fosse possível vertê-lo para outras línguas, aí sim, eles teriam diante de si as duas opções: ou representar esta forma ou manter a tradição. Acontece que eles não têm estas opções. Ou assumem arbitrariamente um termo aproximado e provavelmente desconhecido para o público-alvo ou apresentam ao leitor um termo por ele conhecido, facilmente entendido e pronunciado e que ele já relaciona a Deus. Um caso TOTALMENTE diferente é o das 237 inclusões de 'Jeová' no NT. Elas não têm respaldo nem gramatical nem arqueológico nem teológico. Assim, não acho que a comparação dos números 6973 e 237 seja adequada. São duas questões distintas e precisam ser analisadas em separado. O AT, a LXX e o NT são obras distintas. Embora eles se relacionem, o que é válido para uma não necessariamente o é para a outra. Eu sei que você não é trinitarista, Odracir, como afirmou em sua mensagem anterior. Mas, pessoas trinitaristas prontamente apontam para tais aplicações de textos do AT a Cristo como evidência de que Jeová e Jesus são o mesmo ser, que Jesus é o Jeová do AT. Porém, seguindo esta mesma linha de raciocínio, teremos de reconhecer também que Jesus e Davi ou Jesus e Salomão são o mesmo ser. Esta sua analogia é limitada, pois os atributos dirigidos a Davi e Salomão, nas passagens de II Samuel 7: 14 e Salmo 2: 7 são, na verdade, parte de uma profecia diretamente dirigida ao messias, tendo o próprio Jesus sido chamado de 'filho de Davi' (Mateus 21: 9). Além disso, serem estes homens chamados de 'filhos de Deus', não era algo exclusivo deles. Tal título específico sempre esteve ao alcance de quaisquer outros servos de Deus (o próprio Abraão foi chamado "amigo de YHVH"), sendo, por extensão, perfeitamente aplicável ao rei Davi e seu filho, Salomão . Em Romanos 8: 14, 16, 17, o mesmo termo de Salmo 2: 7 e II Samuel 7: 14 ('filho de Deus') é aplicado genericamente àqueles que se guiam pelo Espírito Santo, no caso todos os membros da congregação cristã. Se o termo é apropriado a pessoas comuns, que dizer então de Jesus Cristo? Está ele abaixo desta honra? Contudo, a continuação de 2 Samuel 7: 14 fala claramente "quando ele cometer uma transgressão", o que torna a inteireza do versículo inaplicável a Cristo. Os judeus conservadores, mais uma vez, se indignaram contra este uso do AT. Uma nota de rodapé da Bíblia de Jerusalém fala que este texto representa, na verdade, um pacto com Davi e sua descendência, não se restringindo apenas à pessoa de Salomão, mas a toda descendência de Davi, da qual, de fato, brotou o messias. O próprio Davi interpreta a passagem assim, no versículo 19 do mesmo capítulo (leia-o). Fica, pois, óbvio que a referência de Hebreus a Salomão e Davi ocorre, não como uma identificação direta de Jesus com estes homens (como propõe sua analogia), mas a) primariamente pelo fato de a passagem tratar-se de uma profecia de longo alcance e b) por aqueles homens terem sido ungidos reis e por serem 'filhos de Deus' no sentido em que toda criatura humana também o é, sendo aceitável uma analogia distante com Cristo. De modo que, o Salmo 2: 7, mencionado por você, guarda correlação com pacto firmado em 2 Samuel 7: 14, aplicando a Cristo, como descendente de Davi, todas as honrarias de um rei. Tais palavras são aplicadas de forma relativa a Davi e de forma profunda a Cristo - trata-se, como falei, de uma profecia, não uma simples descrição de atributos de um homem. Por outro lado, quando se aplicam a alguém atributos que o AT dirigia EXCLUSIVAMENTE ao Deus Todo-Poderoso, a questão é bem diferente. O Salmo 102: 25, por exemplo não é uma profecia, é uma prece de louvor a Deus por seus atributos únicos. Aplicá-lo a um ser humano ou a qualquer criatura seria uma blasfêmia - se Cristo era uma criatura, e não parte do próprio Deus, Paulo poderia estar incorrendo neste pecado. É por esta razão que os trinitaristas legitimam a passagem de Hebreus 1: 10 como uma confirmação da unidade entre Deus e Cristo. Além disso, o versículo 8 faz outra referência ao AT, o Salmo 45: 6, o qual reza, "Teu trono é de Deus, para sempre e eternamente!" (Bíblia de Jerusalém), sendo que a LXX o verte por, "Teu trono, ó Deus, ....". A citação de Hebreus, de acordo com as cópias antigas do NT, parece estar mais de acordo com a forma da LXX. Neste caso, chega-se ao mesmo impasse - ou Paulo blasfemava ou identificava Cristo com Deus. Por esta razão, os trinitaristas preferem a segunda opção. A TNM verte o texto de forma estranha - "Deus é o teu trono...". Ora, essa expressão cria um sério problema, rebaixando o Todo-Poderoso à condição de "trono" de alguém, afinal quem é maior - um trono ou quem se assenta nele? Se, por outro lado, a citação equivale ao original hebraico, "Teu trono é de Deus", como a Bíblia de Jerusalém (uma das mais prestigiadas obras, como já disse) verte o salmo, significa que Cristo assenta-se em um trono no qual o próprio Deus se assenta. Novamente, cria-se o problema da blasfêmia. Os trinitaristas fizeram sua escolha. Já os editores da TNM preferiram buscar uma forma altamente questionável e pouco erudita de traduzir o salmo - as razões eram as de sempre, a saber, não podiam admitir a identificação de Cristo com Deus naquela ou em qualquer outra passagem. Entre ferir esta doutrina e ferir a erudição gramatical, é lógico que preferiram a segunda opção. Não quero de forma alguma dar a entender que o problema da identidade de Cristo está resolvido - dois milênios de controvérsias não levaram a um consenso e as escrituras realmente não esclarecem a questão de forma definitiva. Ambos os lados, unitaristas e trinitaristas, gostam de algumas passagens, mas sentem-se incomodados por outras - prefeririam que jamais tivessem sido escritas da forma como foram. Por isso, coloco-me fora desta batalha - ela nunca levou a nada, exceto intolerância e divisões sectárias. A TNM é fruto direto desta disputa. A seguir, você faz uma análise exaustiva de algumas passagens bíblicas, onde se discute se são ou não citações do AT. Como já falei antes, toda esta discussão é fútil, pois carece de base arqueológica e histórica. Ainda assim, comento alguns textos, por consideração a seu trabalho (excelente, por sinal). Os casos por você alistados podem ser reunidos em grupos: a) Passagens em que a citação é claramente da LXX. A quase totalidade das cópias dela hoje disponíveis não apresentam o tetragrama, tendo sido escritas por pessoas de idioma grego, normalmente cristãos (o Dr. Paul Kahle confirma isso em seu livro The Cairo Geniza). Sendo estas versões amplamente aceitas e utilizadas pelos cristãos dos primeiros séculos, é de se esperar que aqueles que as citam não manifestem preocupação por elas conterem o termo kyrios. E é exatamente isto o que encontramos no NT, de acordo com as evidências documentais. Hebreus 1: 10 encaixa-se neste grupo. O salmo 102: 25, de fato, sofreu um acréscimo por parte dos copistas - o vocativo "ó Senhor", numa sentença onde NÃO há o tetragrama. O apóstolo Paulo não se mostrou preocupado com este acréscimo. Tanto que citou a passagem conforme se encontra na LXX. É o caso de perguntar: por que o copista não preferiu acrescentar "ó Jeová", se o contexto refere-se claramente a Deus? Não seria este procedimento mais adequado à preservação do tetragrama, como prega a Torre de Vigia? Ou será que o acréscimo - intencional ou não - é um forte indicativo do costume de substituir o nome divino pelo termo 'Senhor'? Se este tiver sido o caso, por que Paulo endossaria, sob inspiração divina, tal inserção? É difícil considerar eticamente adequado utilizar um costume espúrio, ofensivo à honra divina, só para poder aplicar uma passagem a Cristo. Além disso, quando Cristo é continuamente chamado pelos cristãos de 'Senhor', um título que o Salmo 102: 25, de acordo com a LXX (citada por Paulo), aplica a Deus, verificamos que tanto o Pai quanto o Filho são 'Senhores'. No entanto, Efésios 4:5 afirma que, há "uma só fé, um só Senhor,..." Se há 'um só Senhor', como Deus e Cristo poderiam compartilhar este título único sem serem parte um do outro? Estas são questões espinhosas para os unitaristas. Conforme vimos, dois versículos antes, Paulo já tinha feito uma declaração bem à moda da LXX, o Salmo 45: 6 (com o vocativo "ó Deus"), dirigido a Cristo. Por outro lado, é interessante que a comissão da TNM não critique a LXX pela inserção de kyrios no Salmo 102. Se tal passagem tivesse sido colocada por Paulo num contexto em que Deus fosse o tema - e não Cristo - não seria difícil que os membros da comissão optassem por "restaurar" o tetragrama neste versículo, argumentando que, embora a citação fosse da LXX, a referência era a 'Jeová'. O fato, destacado por você, de os cristãos pegarem passagens aplicadas a reis humanos e as dirigirem a Cristo só reforça o ponto de que as citações NÃO estavam "engessadas" ao hebraico original. Modificações eram feitas se necessário. Mais uma vez, tomba a tese de inserir 'Jeová' em supostas citações do AT. b) Passagens em que o original hebraico NÃO continha o tetragrama, mas o contexto refere-se a Deus. Romanos 14: 11 é uma destas. Paulo cita, embora não de forma precisa, Isaías 45: 23. Conforme você diz, Paulo parece mencionar outra tradução grega, ou, quem sabe lançando mão de uma paráfrase ou da simples memória. Se foi de outra tradução, é preciso identificá-la para ver se ela contém o tetragrama. Caso seja possível, ainda restaria o problema de explicar por que o apóstolo era tão liberal em suas citações, ora mencionando aquelas que supostamente honravam o tetragrama, ora preferindo outras que NÃO faziam o mesmo. Se não for possível identificar, com razoável certeza, tal documento, então restam as duas outras hipóteses. A primeira, isto é, uma paráfrase, mais uma vez, desautoriza a inserção de 'Jeová', pois o autor não estaria, neste caso, 'obrigado' a reproduzir o nome, caso ele estivesse presente na fonte; a segunda hipótese - a simples lembrança, uma coisa falível - parece incompatível com a inspiração divina. Em todo caso, permanece o fato singelo de que não existe uma só cópia antiga do NT - do qual as cartas de Paulo fazem parte - que contenha o tetragrama. Sem esta evidência, a discussão continua sendo retórica vazia. c) Passagens em que há uma clara alusão ou, no mínimo, se usa o mesmo linguajar de um texto do AT. Nestes casos, os críticos costumam ficar divididos. Porém, em nome da isenção acadêmica, não se pode excluir ou desconsiderar a correlação dos textos. Um tradutor consciencioso certamente não se negaria a por uma nota de rodapé mencionando a possibilidade de o texto em questão ser, de fato, uma citação informal. Filipenses 2: 10, 11 encaixa-se neste grupo. Embora, muitos críticos achem que é uma citação de Isaías e alguns outros achem que não, creio que as duas hipótese devem ser consideradas. Eu menciono este texto em meu artigo apenas para demonstrar mais uma vez que os cristãos faziam menções altamente 'liberais' do AT, o que certamente torna a prática de "restaurar" o tetragrama no NT um ato totalmente arbitrário e inseguro, além de não ter alicerce arqueológico. Salmo 34:8/1 Pedro 2:3 e Isaías 8:13/1 Pedro 3:15 Estes textos aqui merecem séria consideração. Estes são textos do NT que citam/parafraseiam/aludem/referem-se indiretamente a textos do AT que contêm o Tetragrama, contudo, a comissão tradutora da TNM não substituiu o termo “Senhor” destes textos por “Jeová”, conforme o seu critério declarado ...Observe que eles procuraram traduzir cada palavra da linguagem-fonte por uma só palavra da linguagem receptora, mas fizeram isso “tanto quanto o contexto permitiu”. Isso não se deu em todos os casos, ou seja, nos casos em que o contexto de uma determinada passagem exigiu que fosse usada uma palavra diferente da que foi usada em outras passagens. A chave da questão é esta: o contexto. Os tradutores não podem se apegar a regras, critérios e princípios de tradução rígidos, que se aplicam em todas as situações, pois em cada caso é necessário levar em consideração o contexto; não se pode ignorar o contexto duma passagem durante o processo de tradução. O contexto é tão importante quanto a gramática e os critérios e princípios de tradução—ou, pode-se dizer, até mais importante do que eles. Quando é exigido, a gramática, critérios e princípios de tradução devem ceder ao contexto. Assim, provavelmente este deve ser o caso para se ter feito uma exceção aos textos de 1 Pedro 2:3 e 3:15. Eis aí mais uma contradição da comissão autora da TNM. Conforme mostro em meu artigo, a Tradução Interlinear do Reino (publicada pela Torre de Vigia) - a qual, de acordo com as notas de rodapé, serviu de referência para a TNM, embora não a única - traduz o termo kyrios de 2 formas semelhantes: 'Senhor' ou 'senhor'. Já a TNM, apesar da alegação acima, triplicou este número. Justificou isso por apelar ao contexto. Ora, meu amigo, se o contexto é mais importante do que a gramática, está aberto o caminho ao sectarismo. As traduções hebraicas trinitaristas do século 14 são válidas, o NT "espírita" de Johannes Greber é válido, a TNM é válida, e daí não se pode concluir outra coisa, exceto que a Bíblia é um documento obscuro, incompreensível, e que é fútil tentar abstrair dela uma doutrina única. Se um tradutor dirige-se a um texto com uma interpretação prévia do sentido, esta interpretação inevitavelmente contaminará a tradução. Mesmo que, por exemplo, o significado primário de uma palavra seja um, ele poderá escolher um termo correlato, raramente associado àquela palavra, ou a uma construção anômala da sentença, SE ASSIM CONVIER Á SUA PREFERÊNCIA IDEOLÓGICA. Deste modo, foge-se das conseqüências de atender à gramática simples e direta. O impasse permanece - pois é fruto de ideologia, não de erudição - e não se chega a um consenso. Segundo meu entendimento, o tradutor PRECISA SER IDEOLOGICAMENTE NEUTRO. E o contexto, sendo subjetivo, não deve esmagar a gramática, mas conciliar-se com ela. Se eu fosse um perito em árabe antigo e alguém me convocasse para traduzir o Alcorão, certamente eu buscaria me familiarizar com a cultura árabe dos tempos do 'profeta'. Todavia, se uma passagem identificasse Maomé diretamente com Alah - uma blasfêmia para os muçulmanos - eu consultaria teólogos de diversas correntes e procuraria conciliar a tradução com a cultura, sem assassinar a gramática, jamais. Se as correntes ideológicas fossem confusas (o caso da 'briga' secular entre unitaristas e trinitaristas), teria duas opções: a) Atender simultaneamente ao entendimento da maioria dos especialistas e à gramática ou b) Atenderia primeiro à gramática e colocaria uma nota de rodapé indicando que existem controvérsias acerca daquela passagem. A comissão tradutora da TNM não fez uma coisa nem outra. Traduziu ao seu próprio modo, de acordo com a sua conveniência, deixando o leitor em ignorância dos argumentos contrários. O procedimento dos tradutores, de olhar no AT em busca de apoio para quando usariam “Jeová” numa passagem do NT, é importante, mas não tão importante quanto o contexto. Já que é bem claro que aquele referido em 1 Pedro 2:3 e 3:15 é Jesus Cristo, é legítimo – mais ainda, é obrigatório – usar “Senhor”. Inserir “Jeová” aqui seria absurdo, ilegítimo, injustificado e uma violação do contexto das passagens, bem como do contexto global das cartas de Pedro, onde Jeová Deus, o Pai, é distinguido de Jesus Cristo, o Filho. Deveras, os tradutores da TNM puseram-se em uma vereda bastante estreita - de um lado precisavam 'provar' que o NT contém o tetragrama e do outro, precisavam 'provar' que Deus e Cristo não são a mesma pessoa. Como estes dois objetivos entram em conflito em certas passagens, acharam menos danoso abrir mão do tetragrama em uma citação do AT, quando aplicada a Cristo, do que admitir a existência dele na passagem e ver sua doutrina unitarista tombar por terra. A lógica que você expõe acima é a lógica dos unitaristas, a qual pode ser facilmente contestada por outra lógica, a dos trinitaristas autores das traduções hebraicas do NT, assim - 'Se Cristo e Deus são a mesma pessoa, seria absurdo, ilegítimo, injustificado e uma violação do contexto das duas passagens NÃO inserir 'Jeová' nelas. Inseri-lo em 1 Pedro 2: 3 e 3: 15 é legítimo, mais ainda - é obrigatório!'. Percebe, amigo R.? Um grupo vê aquilo que você chama de "contexto" de uma forma e o outro o vê no sentido contrário. Quem está com a razão? É interessante que tanto um grupo quanto o outro DESPREZOU TOTALMENTE AS MAIS DE 5000 CÓPIAS ANTIGAS DO NT, NO AFÃ DE PROPAGAR SUAS DOUTRINAS. Para mim, ambos violaram o NT e, portanto, eles se equivalem... Este tipo de aplicação de textos do AT a Cristo é uma prática comum dos escritores do NT. Não precisamos entender isso como se os escritores do NT estivessem putativamente querendo identificar Jesus Cristo como Jeová Deus. Se, por um lado, não "precisamos" entender que eles queriam identificar Cristo com Deus, por outro, também não "precisamos" descartar, a priori, esta possibilidade, A MENOS QUE NOSSAS CONVICÇÕES TEOLÓGICAS NOS OBRIGUEM A ISSO. Onde falta isenção falta verdade. Tal prática deve ser entendida sob a luz de textos onde o próprio Jesus declara: “Quem me tem visto, tem visto [também] o Pai. . . . o Pai, que permanece em união comigo, está fazendo as suas obras. . . . Acreditai-me que estou em união com o Pai e que o Pai está em união comigo” (João 14:9b, 10c, 11a); “Eu e o Pai somos um” (João 10:30); “Sou representante dele, e Este me enviou” (João 7:29); “Vim em nome de meu Pai” (João 5:43); “Quem depositar fé em mim, deposita fé, não [somente] em mim, mas [também] naquele que me enviou” (João 12:44); “Quem me receber, recebe [também] aquele que me enviou” (João 13:20); “Quem me odeia, odeia também o meu Pai” (João 15:23); também, textos onde os apóstolos declaram que o Filho de Deus, Jesus Cristo, é “a imagem de Deus” (2 Coríntios 4:4; Colossenses 1:15), é “o reflexo da [sua] glória e a representação exata do seu próprio ser” (Hebreus 1:3). Assim, devido ao fato de o Filho refletir perfeitamente as qualidades do Pai e fazer as obras do Pai, e em nome do Pai, pode-se corretamente tomar atributos/qualidades/aspectos e ações/obras de Jeová Deus e fazer aplicação deles a Jesus Cristo; princípios que se aplicam ao Pai, podem também ser aplicados ao Filho. A revista A Sentinela, 1 de junho de 1994, no artigo ““Jesus Cristo é Senhor” – como e quando?”, página 30, oferece uma explanação razoável, dizendo que “às vezes, um texto nas Escrituras Hebraicas refere-se a Jeová, mas por Ele delegar poder e autoridade, cumpre-se em Jesus Cristo.” Em seguida, ela dá como exemplo Salmo 34:8, aplicado a Cristo em 1 Pedro 2:3. Adicionalmente, a TNM c/ ref. apresenta um comentário do Professor F. J. A. Hort... Os textos acima citados são os preferidos da Sociedade torre de Vigia, pois parecem apoiar o unitarismo. Como você deve saber, os trinitaristas também têm explicações 'conciliatórias' para eles, recorrendo, às vezes, ao mesmo tipo de "ginástica mental" que as Testemunhas de Jeová fazem para explicar textos como Isaías 9: 5,6 - onde se chama (em tempo passado, na Bíblia de Jerusalém) o messias ainda não nascido de Pai Eterno e Deus Poderoso -, ou o altamente polêmico João 1: 1 - onde se diz que o Logos estava com Deus e era Deus -, ou João 8: 58 - onde Cristo aplica a si mesmo um trocadilho com a expressão "EU SOU", lembrando aquela de Êxodo 3: 14, e, por isso tentam apredrejá-lo por blasfêmia -, ou João 20: 28 - onde Tomé fala a Cristo, "Meu Senhor e Meu Deus", sem ser repreendido por idolatria -, bem como os diversos textos que aplicam a Cristo o termo proskineo [adorar] e a TNM sempre o traduz por "prestar homenagem", vertendo por "adorar" apenas quando a referência é a Deus. Como já falei, tanto unitaristas quanto trinitaristas têm motivos para se sentirem incomodados. O artigo de A Sentinela busca apenas propor, para as muitas aplicações do AT a Cristo, uma alternativa que não fira seu pensamento unitarista. Trata-se apenas de uma tese, não um fato estabelecido. E como analogia, deixa bastante a desejar - o fato de um monarca delegar poderes a um subordinado não faz deste último um portador dos títulos e dos feitos daquele que o nomeou, torna-o apenas um representante. O monarca certamente não atribuiria toda a sua glória e feitos passados àquele a quem nomeou. Se Cristo era criatura, não poderia ser adorado, sob o risco de o próprio Deus ter introduzido o politeísmo. Também não poderia ter atribuídos a si atributos e honrarias que o AT aplica única e exclusivamente ao Criador. Em Isaías 42: 8, Deus diz que não divide sua glória ou honra com quaisquer deuses (ou 'Deus', termo que a Torre de Vigia aplica a Cristo de forma relativa). Porém, não é isto que vemos no NT. O fato é que nele, quer o reconheçamos quer não, há louvores excessivos à pessoa de Cristo, atribuindo-lhe características e feitos que os escritores do AT imputavam exclusivamente a Deus, incluindo-se cânticos de adoração. No capítulo 8 do evangelho de João (que já mencionei), Jesus, falando de si mesmo, faz três trocadilhos com a expressão ego eimi ["Eu Sou"] - duas diante dos discípulos e uma diante de judeus, os quais tentaram apedrejá-lo imediatamente. Ora, por que fariam isso, senão como uma reação imediata ao uso blasfemo de uma expressão que, na mente deles, estava ligada à revelação do nome de Deus a Moisés (Êxodo 3: 14)? A maioria dos peritos relaciona claramente estas palavras gregas do evangelho com aquelas hebraicas de Êxodo. Devemos desconsiderar este entendimento em nome de uma doutrina? Se Cristo falava apenas de sua idade, como diz a Torre de Vigia, afirmando ter vivido antes de Abraão, isto só daria aos judeus a impressão de que ele era um doente mental, não um blasfemador. Por outro lado, se ele se identificava com o próprio Deus, aí sim, fica fácil compreender porque quiseram matá-lo naquele mesmo momento - a lei mosaica prescrevia tal pena para os culpados de blasfêmia. Certamente, não podemos culpar os trinitaristas por preferirem identificar Cristo com Deus, pois isto lhes parece mais aceitável do que admitir que uma criatura usurparia aquilo que, por direito, cabe apenas a Deus. Já os unitaristas acham difícil aceitar que o Ser Supremo se diminuiria ao ponto de tornar-se uma reles criatura humana, nascida de uma mulher. Também, consideram a noção de trindade como politeísta, ao passo que os trinitaristas afirmam que a visão das Testemunhas de Jeová, esta sim, incorre em politeísmo. Deste modo, a polêmica - que começou já nos primeiros séculos - está muito longe de ter fim. Eu prefiro me por fora desta batalha sem sentido. Quanto ao comentário do Prof. Hort - relativo ao linguajar livre de Pedro ao citar o AT - eu o menciono em meu artigo, pois ele apenas confirma o que já se sabe - os cristãos faziam adaptações/alusões/trocadilhos/analogias com os textos hebraicos. Se Pedro e os demais apóstolos faziam menções 'livres demais' para se deduzir que queriam identificar Deus e Cristo, certamente elas também são demasiado incertas para se lhes acrescentar o termo 'Jeová'. Isso para não falar da falta de apoio arqueológico. Quanto ao nome divino na LXX, eu tenho algo a dizer. Nenhum dos manuscritos da LXX do segundo e do primeiro século AEC e do primeiro século EC contém κύριος [kýrios] como substituto para o Tetragrama divino הוהי [YHWH], o nome de Deus. Nós encontramos o nome de Deus escrito em caracteres hebraicos arcaicos, em escrita aramaica e em letras gregas como a transcrição fonética ΙΑω (IAŌ) nos fragmentos da LXX 8HevXIIgr, P. Fouad 266 e 4QLXXLevb, respectivamente. Até aonde eu pesquisei, não há nenhum exemplo do uso de kýrios no lugar do Tetragrama antes da metade do segundo século EC. Um erudito, chamado P. W. Skehan, sustenta que a primeira forma do nome divino a ser usada na LXX foi a forma grega ΙΑω (IAŌ), e, começando no primeiro século AEC, o Tetragrama em escrita aramaica foi usado. Então, a partir da última parte do primeiro século AEC até a queda da comunidade do Qunrã em 68 EC, o Tetragrama em caracteres hebraicos antigos foi usado. Depois disso, kýrios passou a ser usado como substituto do nome divino na LXX. (The Divine Name at Qumram, in the Masada Scroll and in the Septuagint, Bulletin of the International Organization for Septuagint and Cognate Studies 13 (Cleveland State University), 1988, pp. 28-35) Adicionalmente, nos grandes códices do quarto e quinto século EC, que contêm a inteira LXX, e no papiro Chester Beatty, datado por Frederick Kenyon da metade do segundo século EC, não encontramos nem o Tetragrama, nem IAŌ e nem kýrios! Nos lugares onde o Tetragrama ocorre no texto hebraico, nós encontramos κς (ks) e às vezes θς (ths) com um traço horizontal sobre eles. Estas letras são abreviações de kýrios (“Senhor”) e theós (“Deus”); outras designações divinas também foram abreviadas. Isso demonstra a diferença entre como o nome divino foi tratado nestes manuscritos e naqueles que foram escritos entre o segundo século AEC e o primeiro século EC. Assim, pode-se apontar algumas mudanças importantes no texto da LXX que ocorreram a partir do final do primeiro século EC: o Tetragrama foi substituído por kýrios e, posteriormente, kýrios e outras designações divinas foram substituídos por abreviações. Isso mostra que os copistas mudaram o texto da LXX; eles removeram o nome divino e o substituíram por kýrios e, posteriormente, introduziram abreviações para ele e outras designações divinas. Caro R., agradeço-lhe imensamente pelo envio deste trecho, pois acrescenta mais detalhes ao que eu já havia estudado. Realmente, as primeiras cópias da LXX devem ter incluído a palavra hebraica, sem tradução. Há fortes indícios de que houve cópias deste tipo circulando entre os judeus até o 3o. século DC. Porém, lembre-se de PARA QUEM elas foram escritas - para pessoas de língua grega, as quais não mais conheciam o hebraico antigo. Cerca de 3 séculos antes de Cristo começou o trabalho de produzir a LXX, justamente porque as gerações subseqüentes de judeus não mais usavam ou conheciam seu antigo idioma pátrio. Se não conheciam a língua em si, que dizer de um termo em particular, originário desta mesma língua e cujo som não se ouvia há séculos? Aqui, não cabe julgar o antigo costume judeu, mas aferir suas inevitáveis conseqüências sobre as gerações futuras. Imagine, portanto, como as pessoas dos tempos cristãos reagiam ao encontrarem, em seu exemplar grego da LXX, um palavra estrangeira, sem sons vocálicos e cuja pronúncia não mais se conhecia. Um dos Pais da Igreja, Jerônimo, declara que, em seu próprio tempo, algumas pessoas chegavam a fazer a pronúncia dobrada das letras gregas p ('Pi-Pi'), usadas, juntamente com outras duas, como substitutivo visual do tetragrama, por sua semelhança com os caracteres hebraicos. Portanto, a existência do tetragrama em exemplares da LXX em mãos de judeus ou gentios de língua grega, nos primeiros séculos, não implica, em si mesma, que eles o pronunciassem, ou, ao menos, conhecessem seu som. Mais que isso, a presença do tetragrama em um número de cópias da LXX nos tempos de Cristo de forma nenhuma prova - como diz a Sociedade Torre de Vigia - que os escritores cristãos o reproduziram em seus textos, os quais eram em grego , não hebraico. A LXX e o NT são obras distintas, criadas em épocas distintas, por culturas distintas. Asseverar que uma palavra encontrada em um documento deve necessariamente estar presente no outro, sem averiguar as evidências históricas, é incorrer em erro grosseiro. Como também é erro deduzir que aquilo que era apropriado a um judeu devoto, também o seria a um cristão. Mais uma vez, é preciso consultar os registros históricos. A prática de preservar os caracteres hebraicos no texto grego era JUDAICA, não cristã (os papiros Fouad, mencionados em sua mensagem, são de origem judaica, por isso contém o tetragrama). Neste ponto, vale lembrar que os judeus conservadores viam a LXX com suspeita, sendo que Áquila, Teodósio e Símaco (já mencionados nesta mensagem) produziram suas próprias traduções gregas do AT justamente por considerarem-na como uma versão corrompida das escrituras hebraicas. Se não era merecedora de uma qualificação tão pesada, pelo menos, é preciso reconhecer que ela não era 100% confiável (continha erros de tradução, acréscimos e omissões). Ainda assim, os cristãos a adotaram amplamente. Por sua vez, os adeptos radicais do judaísmo chegaram ao ponto, mais tarde, de destruírem toda literatura que consideravam 'cristã', incluindo cópias da LXX. Os cristãos, além de as utilizarem, tinham seu próprio sistema de nomenclatura (Nomina Sacra), INDEPENDENTE DO VOCABULÁRIO JUDAICO. Por esta e outras razões, os judeus consideravam o cristianismo uma seita herética. Segundo o perito Paul Kahle (citado várias vezes na obra "Ajuda ao Entendimento da Bíblia"), o emprego do termo kyrios em suas cópias da LXX foi implementado pelos PRÓPRIOS CRISTÃOS, pois não compreendiam os sinais hebraicos. Se havia nisso alguma heresia (como diz a comissão da TNM) , então os cristãos teriam sido os primeiros culpados dela, pois, segundo todas as evidências históricas encontradas até esta data, eles usavam, não o tetragrama hebraico, mas um termo correspondente a ele, em grego ('Senhor' ou 'Deus'), já que o termo original estava em desuso há várias gerações, era desconhecido e intraduzível. Se houve, por parte deles, em alguma época, a disposição de destruir todas as cópias do NT que continham o tetragrama, certamente não conseguiriam destruir todas. Eram centenas, talvez milhares de cópias espalhadas por três continentes. Assim como algumas cópias judaicas da LXX (contendo o tetragrama) sobreviveram ao ataque dos radicais, pelo menos algumas cópias do NT teriam sobrevivido a uma altamente improvável 'conspiração' para remover o tetragrama dos escritos apostólicos (a tese da Torre de Vigia). Todavia, não há uma sequer - dentre as mais de 5 mil existentes! Tampouco há registro de tal heresia em parte alguma, nem em outras cartas cristãs do primeiro século nem nas obras dos Pais da Igreja (Orígenes, Irineu, Justino e outros). Ao passo que os judeus procuravam destruir as cópias da LXX, os cristãos seguiam produzindo mais e mais, só que com a palavra kyrios ['Senhor'] nas referências a Deus. Isto explica porque as cópias da LXX contendo o tetragrama são hoje tão raras, tendo este fato induzido alguns estudiosos a suporem erroneamente que elas jamais tinham existido nos tempos de Cristo. Hoje sabemos que existiram, muito embora não possamos determinar, com certeza, quais cópias da LXX eram usadas pelos discípulos. Concordemente, os massoretas do 4o. século, ao introduzirem pontos vocálicos, escolheram como fonte das vogais a mesma palavra empregada pelos judeus, já antes do nascimento de Jesus - 'Senhor' (adhonay) - o que acabou gerando o equívoco de leitura 'Jeová' (que é um erro mesmo, estando comprovado por várias enciclopédias que eu cito em meu artigo). Tinha de ser assim, pois eles próprios ignoravam a pronúncia. Hoje sabemos - conclusão confirmada pelos peritos no assunto - que o fator que determinava a existência do tetragrama ou do substitutivo kyrios era a simplesmente a origem do manuscrito. Os judeus preservavam as letras hebraicas, embora pronunciassem, há muito tempo, 'Deus' ou 'Senhor', enquanto os gentios e os cristãos passavam todo o texto para o grego, inserindo as palavras Theos ou Kyrios. Aqui, vemos claramente que, embora nascido do judaísmo, o cristianismo tinha um acentuado grau de independência deste, tanto nos costumes quanto nos termos usados em sua adoração. Portanto, a resposta à pergunta sobre o suposto uso do tetragrama pelos cristãos NÃO É TEOLÓGICA (como faz a comissão da TNM) , MAS HISTÓRICA. Nem a questão de adotar os termos 'Jeová', 'Javé' ou 'Iavé' restringe-se meramente ao aspecto fonético - como a comissão da TNM busca fazer crer - mas trata-se, antes de tudo, de uma questão de coerência com os manuscritos cristãos, DA FORMA COMO CHEGARAM A NÓS. Em reforço a isto, devemos mencionar o fato de que, embora o costume de referir-se a Deus por substitutivos já persistisse por séculos, bem antes de Cristo, ele, durante seu ministério, NÃO DEU UMA SÓ PALAVRA SOBRE ESTE ASSUNTO NEM CRITICOU QUALQUER COSTUME ENVOLVENDO O TETRAGRAMA. Ao contrário, para o desgosto da Sociedade Torre de Vigia, ele referiu-se a Deus continuamente como 'Pai', não mencionando o tetragrama nem mesmo na oração-modelo. Um último aspecto precisa ainda ser destacado: a Sociedade Torre de Vigia busca desqualificar os termos Elohim e Adhonay ("Ajuda ao Entendimento..." , p. 847) por afirmar que estes são apenas títulos e, portanto não estão à altura do Todo-Poderoso - a verdade é que EM PORTUGUÊS E NOUTROS IDIOMAS eles parecem ser títulos, MAS NÃO NO HEBRAICO ANTIGO. O termo Elohim, mesmo estando flexionado no plural, traz o verbo e o adjetivo no singular. Além disso, tal termo não aparece em nenhuma outra língua semítica, nem mesmo no aramaico usado em textos como Esdras, caps. 4-6, e Daniel, caps. 2-7. Quanto ao termo Adhonay, na forma como ocorre em hebraico, de acordo com o mundialmente respeitado perito alemão, Gesenius, NÃO SE REFERE JAMAIS A OUTRO SER QUE NÃO O PRÓPRIO DEUS. Quando uma pessoa, naquela cultura, era chamado 'Senhor', usava-se o termo adhoni ou adhon, e não adhonay, por este último dirigir-se apenas a Deus. É assim, por exemplo, que Ana se dirige a Eli em I Samuel 1: 15, 26. Muito embora tanto adhonay quanto adhon sejam traduzidos para o português, ambos, como 'Senhor', o significado deles, na língua de origem, era TOTALMENTE DIFERENTE, provocando reações diferentes no ouvinte. Este é um daqueles problemas que surgem toda vez que se deseja transpor a barreira lingüística. É por esta razão que diversas versões da Bíblia, referindo-se ao Deus de Israel, normalmente vertem 'Senhor' em maiúsculas (versalete), de modo a diferenciar o nome divino do uso genérico da palavra. A comissão tradutora da TNM, infelizmente, trata o problema de um perspectiva que não leva em conta nem a cultura nem a língua dos judeus pré-cristãos, fazendo os incautos crerem que naquele tempo se enfrentava a mesma questão gramatical de hoje. Infelizmente, as explicações tendenciosas da Sociedade Torre de Vigia soam bem convincentes aos leigos. Uma lástima! Quanto à sua citação do comentário do Dr. Julius Mantey sobre a TNM, também quero dizer algo. Esta bem conhecida afirmação dele encontrada na Internet diz o seguinte: “A shocking mistranslation. Obsolete and incorrect. It is neither scholarly nor reasonable to translate John 1:1 ‘The Word was a god’.” (= “Uma chocante má tradução. Obsoleta e incorreta. Não é nem erudito, nem razoável traduzir João 1:1 ‘A Palavra era um deus’.”). Deve-se atentar para o fato de que a sua afirmação não diz respeito à TNM como um todo (embora eu não duvide de que ele achava isso dela), mas, especificamente, à tradução de João 1:1 pela TNM. Quero informar que a afirmação dele não procede. Na época em que ele fez esta afirmação, havia uma suposta “regra” gramatical grega, elaborada por E. C. Colwell, que veio a ser conhecida como a “regra de Colwell”. Muitos eruditos, críticos, apologistas e comentaristas, tais como Bruce M. Metzger, William Barclay e Walter Martin, fizeram afirmações parecidas, usando esta “regra” para condenar a maneira como a TNM verte João 1:1. Porém, a erudição moderna mostrou que a “regra" de Colwell é falaciosa e inválida, e não tem relevância nenhuma em relação à maneira de se traduzir João 1:1. Amigo R., infelizmente, você teve acesso a apenas parte das declarações do Dr. Mantey. A opinião publicada na internet, embora dirigida à passagem de João 1: 1, reflete, de fato, o pensamento daquele intelectual sobre a TNM como um todo. Na verdade, eu tenho a inteireza da declaração do Dr. Mantey em vídeo (feita há uns 15 anos). Na entrevista, o professor segura um exemplar da TNM em uma das mãos, enquanto diz, "eu jamais vi uma assim chamada 'tradução' estar tão distante daquilo que os manuscritos hebraicos e gregos realmente dizem, quanto esta - a TNM, das Testemunhas de Jeová. Trata-se de uma obra por demais tendenciosa, na qual os autores alteram os textos em diversas partes, de modo a encaixá-los em suas doutrinas, especialmente no que se refere a Jesus Cristo..." O professor foi além disso, enviando uma correspondência aos escritórios da Torre de Vigia, na qual exige uma retratação escrita pelo mau uso de sua gramática na literatura da Sociedade e advertindo seus representantes dos rigores da lei pelo uso não autorizado de um trabalho intelectual. Assim sendo, não creio que ele mudasse seu ponto de vista pelo simples fato de a regra de Colwell ter sido revista. Ela é apenas um dos muitos pontos questionáveis da TNM. As declarações do eminente professor são importantes pelo fato de ele ser uma autoridade no assunto, autor de gramáticas e mundialmente respeitado. Trata-se de um assunto acadêmico e os autores da TNM têm, até esta data, ocultado-se por trás do anonimato, de modo que É IMPOSSÍVEL VERIFICAR SE ELES TÊM CREDENCIAIS COMO ERUDITOS, credenciais estas que possam estar à altura daquelas do prof. Mantey e diversos outros. Só assim suas afirmações podem ser consideradas como dignas de crédito. Do contrário, a situação pode cair no ridículo. Segundo Bill Cetnar, o qual trabalhava em Betel na época da confecção da TNM, seus autores incluíam Fred Franz, Nathan Knorr, George Gangas e outros membros do corpo governante - NENHUM DELES COM QUALIFICAÇÕES UNIVERSITÁRIAS PARA O TRABALHO. Franz, embora fosse autodidata e tivesse algum conhecimento de hebraico, não soube traduzir, em juízo (caso Walsh, década de 50), um trecho simples de Gênesis; Knorr não tinha quaisquer conhecimentos de línguas mortas e Gangas, grego de nascimento, costumava ser o cozinheiro de Betel. Deste modo, caro R., fica difícil avaliar o peso das declarações acadêmicas dos atuais defensores da TNM se eles recusam-se a se identificar por nome. Você deve saber que, em se tratando de discussão técnica, o currículo dos palestrantes é fundamental. Se você fosse um PhD em uma matéria, dificilmente aceitaria discutir um assunto dela com um leigo ou alguém apenas formado. Eu, particularmente, toda vez que quero aprender um assunto, procuro as obras de grandes peritos na área e isso se mede pelo nível acadêmico e o prestígio das obras deles entre outros peritos. Assim sendo, por que se dá que trabalhos como a Bíblia de Jerusalém e outros são tão prestigiados e amplamente usados em seminários, congressos etc., ao passo que a TNM encontra forte resistência do público, ficando seu uso praticamente restrito às Testemunhas de Jeová? Ora, nem mesmo movimentos unitaristas - que têm pontos doutrinários em comum - adotam como padrão a versão das Testemunhas! Dar-se-ia isso apenas por preconceito ou porque, de fato, a TNM é uma obra tendenciosa e altamente questionável do ponto de vista gramatical? Em minhas pesquisas sobre a TNM, eu constatei que a rejeição da TNM por parte de vários eruditos, críticos, apologistas e comentaristas é por motivos teológicos, e não por motivos lingüísticos. Eu, particularmente, acho a TNM uma excelente tradução e gosto dela. A Sociedade pode ter feito muitas coisas ruins, reprováveis e detestáveis, mas uma das coisas boas que ela fez foi a TNM, na minha opinião.
Se
você se refere às comunidades religiosas trinitaristas - especialmente as
evangélicos -provavelmente tem uma boa medida de razão. Porém, afirmar que
as falhas da TNM são apenas de natureza teológica, e que ela é contestada
apenas com base na teologia, requer uma boa dose de preconceito positivo
para com ela. Decerto, se fôssemos discutir cada ponto dela que é
contestado por peritos em línguas mortas, com base na
gramática, creio que passaríamos muitos dias ou até meses em
tais análises (o que, provavelmente não seria interessante, nem para nós nem
para a lista). Segundo o autor da obra "Los Testigos de Jehová a la Luz de
la Biblia", Jose Luiz Garcia, a TNM não foi tirada diretamente das línguas
originais, hebraico, aramaico e grego, mas trata-se de um trabalho de
revisão de uma antiga versão inglesa, possivelmente a Versão Autorizada,
também chamada de Rei Jaime. Se isto tiver algum fundamento - e não é
absurdo pensar que tem se levarmos em conta as 'credenciais' dos prováveis
tradutores - trata-se de um fato grave e desabonador da credibilidade da
obra. Curiosamente, a comissão da TNM trata de afirmar antecipadamente que
ela não é um trabalho de revisão ("Testemunhas de Jeová no Propósito
Divino", em inglês). Quanto aos textos-fonte, apesar do suposto uso
do trabalho de Rudolf Kittel para o AT, uma nota na p. 1502 afirma
que, em 134 lugares, seguiu outro texto, o de Ginsburg, no qual
aparece o tetragrama. Se considerarmos o trecho de Isaías, os rolos do Mar
Morto confirmam Kittel e não Ginsburg. Também diz-se, na
TNM com referências, que o texto base para o NT foi o de Westcott
e Hort. No entanto, ele não contém o tetragrama em parte nenhuma. A
própria "Tradução Interlinear do Reino" (já mencionada), lançada pela
Sociedade, também não o contém. Já versão em português, à base da própria
declaração contida no prefácio ("nos últimos 34 anos, a Tradução do Novo
Mundo foi traduzida em parte ou inteiramente
em mais dez idiomas,..." ), foi feita a partir dos originais em inglês
(um dos tradutores seria o Sr. Erick Kattiner, um austríaco,
residente em Betel) e não dos manuscritos dos primeiros
séculos, como deveria ser toda tradução deste tipo. Aliás,
do ponto de vista dos peritos, isto é uma falta gravíssima. Realmente, há
trechos com "gosto" de inglês, confirmando esta prática. Além disso, a
introdução da TNM (com referências) afirma não conter
paráfrases, o que não é verdade
- conforme já mencionei, em Gênesis 1: 2, vemos uma escandalosa paráfrase
do termo ruah, chamando-o de 'força ativa', quando não há qualquer
razão gramatical ou contextual para a inserção deste termo. Os tradutores da
respeitadíssima Bíblia de Jerusalém vertem a passagem pelo que de fato, a
gramática indica - "um vento de Deus". Além disso, é a própria comissão
tradutora da TNM que ataca todas as outras versões da Bíblia, acusando-as de
estarem cheias de "incoerências, traduções insatisfatórias, infectadas de
tradições sectárias ou filosofias mundanas" ("Toda a Escritura é
Inspirada...., p. 314). Um julgamento tão duro sobre outros trabalhos
certamente traz um julgamento rigoroso para com o trabalho da própria
Sociedade - ela atacou primeiro. Ataques ferozes a outras organizações são o
forte da Sociedade Torre de Vigia, desde os tempos de Rutherford. É o
caso de perguntar se aqueles que combatem a TNM são menos preconceituosos
dos que os autores dela são em relação às traduções católicas, protestantes
etc. Por isso, insisto que o autores da TNM se identifiquem e que alguém,
afinal, assuma a responsabilidade acadêmica por ela. Estou certo de que, ao
adquirir um livro técnico, você se asseguraria antes das altas credenciais
do autor naquele tema. Não deveria ser diferente com a Bíblia. As diversas
traduções dela surgiram em função de transformações sociais e lingüísticas -
não foi o caso da TNM, ela foi criada para fazer crer que Deus apóia um
entidade religiosa em particular. Assim sendo, meu amigo, o Corpo
Governante, de fato, fez muitas coisas detestáveis - inclusive a TNM! Eu
jamais a recomendaria para um estudante das escrituras, a não ser para
mostrar como elas podem ser distorcidas para atender a esta ou àquela
doutrina. Esta é minha opinião, pelos motivos aqui descritos. Agradeço-lhe imensamente pelas informações providas e digo-lhe que trocar idéias com você tem sido uma experiência enriquecedora.
Odracir
|